Não nasci cá, tão-pouco fui criado por aqui, mas já são quase 15 anos de convivência diária. E desde a primeira hora me disseram que Ovar é uma boa madrasta. Confirmo.
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Tanto que me sinto confortável dentro deste estatuto de sitiado que ontem ganhei. Sei que as saudades do meu Porto vão apertar, mas sossego na certeza de que estou bem entregue. As gentes da terra que, para mim, tem sido, sobretudo, dormitório, são bravas e conscientes. De tal forma que nem foi preciso decretar o estado de calamidade municipal para ver Ovar aberto à luta contra a propagação do Covid-19. Bastou uma passagem de carro pelo Furadouro, no fim de semana, para testemunhar que a população já se posicionava no sentido de cortar o mal pela raiz.
O cenário deserto que observei não era motivado pela ressaca do Carnaval. Sei que, em condições normais, os filhos da terra teriam aproveitado cada raio de sol naquelas margens do Atlântico. Era apenas o início de um cerrar de fileiras, uma jogada coletiva de antecipação, que ganhou ontem mais sentido. Ainda assisti a uma corrida de última hora às compras, pedidos de boleia por telefone devido aos autocarros suprimidos, filas com a desejada distância à porta das farmácias de serviço e muitas máscaras que não aquelas que caracterizam Ovar. Agora, faço uma pausa na varanda e o cenário é em tudo idêntico ao daquele sábado no Furadouro: um vazio de consciência extrema.
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