Praia de Árvore perdeu a Bandeira Azul. Quem a conhece lamenta, mas não estranha
Moradores criticam poluição em areal de Vila do Conde que perdeu bandeira azul.
Corpo do artigo
“Há 20 anos, tirávamos daqui um saco de peixe todos os dias. Agora, passa-se um mês sem pescar um peixe!”, atira Manuel José Bouça, olhando o mar. O rio, “a dois passos”, traz o lixo e a poluição. O peixe foge, e “vira e mexe”, deixa a água inquinada. A praia de Árvore, em Vila do Conde, perdeu a bandeira azul, que ostentava orgulhosamente desde 2020. Quem a conhece bem lamenta, mas não estranha.
A Câmara de Vila do Conde diz que as análises foram feitas "depois de um dia de temporal" e isso "alterou os resultados". Agora, só resta esperar pelo próximo ano para voltar a candidatar Árvore à Bandeira Azul.
“Antigamente dava aqui de tudo: polvos, caranguejo, robalo…”, conta Carlos Gonçalves, 72 anos. Árvore foi a sua praia das brincadeiras de criança. Hoje pesca à linha ali quase todos os dias, “mais por passatempo”. De longe a longe, lá leva um robalo ou um sargo para o almoço. No verão, explica, a praia tem “muito movimento”: em frente ao mar, são dezenas os apartamentos “de férias”. Gente da Trofa, Santo Tirso, Famalicão, Guimarães e Paços de Ferreira. Mais “os que vão e vêm todos os dias”, agora que “pela autoestrada é um tirinho”.
“Antigamente os esgotos iam todos para o mar. Agora há tratamento e continuamos a ter poluição no rio. Não entendo”, diz Manuel José, também ele “nascido e criado” em Árvore.
A verdade é que a praia de Árvore foi, desde sempre, problemática e a proximidade da foz do rio Ave ajuda a explicar o fenómeno.
Nas últimas duas décadas esteve cinco anos interdita (2005-2009) e, em 2006 e 2007, foi eleita pela Quercus a “pior praia do país”. Em 2010, abriu a ETAR de Tougues – o concelho que tinha até então 30% de cobertura de rede de esgotos – e Árvore entrava “num bom caminho”. Em 2014, o investimento começava a dar frutos: 2014-2016 análises sempre “boas”, 2017-2019, resultados “excelentes”. Em 2020, chegava a bandeira azul. Desde então, as análises andaram sempre entre o “bom” e o “excelente”, mas em 2024, com duas análises consecutivas negativas, a praia acabou desaconselhada a banhos entre 11 e 17 de julho.
“As pessoas também não têm cuidado nenhum. Comem um gelado, deixam o papel. Fumam, atiram a beata para o chão. Assim, não vamos lá”, remata Carlos Gonçalves, cansado de ver o areal cheio de lixo.
No bar Areal, Manuel Ferreira, ali desde 1961, encolhe os ombros. O “mal” vem de trás – dos 20 anos “negros” – e a bandeira azul não lhe trouxe mais clientela. Agora, também não espera mudanças.