Zona Histórica do Porto em sobressalto com possibilidade de o rio Douro voltar a galgar margens. Autarca diz que compensações estatais de anos anteriores não chegaram.
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Mesas, cadeiras, armários, frigoríficos e arcas congeladoras. Tudo foi retirado atempadamente das lojas do cais da Ribeiro do Porto para zonas mais altas. Nada a que a população desta zona da cidade, mas também de Miragaia, não esteja habituada. Temem a perda de bens nas cheias, como a que foi anunciada ontem mas que, felizmente, não ofereceu perigo. As seguradoras não aceitam fazer apólices em zonas de cheia e as indemnizações pelos prejuízos, apesar de prometidas pelo Estado, nunca se concretizam.
Evitar prejuízos
Os olhares fixavam-se no rio que corria depressa sob o tabuleiro inferior da Ponte Luís I. Às 14.30 horas, altura da preia-mar, receava-se o pior como em anos anteriores com a água a subir rapidamente e a galgar o cais. "Há anos que andamos a falar na mesma coisa e depois nada é feito e a culpa acaba sempre por ser atribuída aos espanhóis quando é nossa", refere António José Fonseca, presidente da União de Freguesias da Zona Histórica do Porto, que defende a criação de barragens de contenção ao longo deste curso de água. "É sempre o vira o disco e toca o mesmo. Os comerciantes, moradores e até agricultores não têm dificuldade em conviver com as cheias, mas têm dificuldades em conviver com os prejuízos. Sempre que há cheias surgem as promessas de que serão pagos os prejuízos mas depois tudo é esquecido", relembra António José Fonseca, também presidente da Associação de Bares da Zona Histórica.
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Apoio da autarquia
"O importante é não termos perdas numa altura como esta, que não estamos também a faturar, mas as autoridades foram espetaculares. Fomos atempadamente avisados pela Proteção Civil, que encaminhou para aqui várias carrinhas para o transporte dos bens e a Câmara do Porto até disponibilizou um armazém para guardar as coisas", conta Cláudia Leite, proprietária do restaurante De Ouro.
A maior cheia de que Falcão Jesus se lembra é a de 1962, tinha na altura oito anos. "A água invadiu toda esta zona até à Rua dos Mercadores. Foram momentos de muita aflição, porque as águas subiram rapidamente e não houve tempo de salvar nada. Moravam aqui muitas pessoas que vinham da província e viviam em quartos", conta.
Seguiram-se as cheias de 1978, de 1979 e 1996. Já este século, é lembrada a situação vivida de 7 de dezembro de 2000 até 23 de março de 2001, um total de 13 cheias seguidas. "É preciso ver que na altura tínhamos 10% dos estabelecimentos comerciais que temos hoje. Uma grande cheia poderia agora provocar uma calamidade junto dos empresários que financeiramente já não estão bem devido à pandemia", acrescenta António José Fonseca.
David Tavares, que reside na zona histórica, diz que "a Ribeira sempre teve cheias" e destaca a importância das barragens e das autoridades que "hoje estão mais atentas" na previsão e no aviso à população. A Câmara do Porto nota que, "prevenidos pelo alerta laranja, moradores e comerciantes de Miragaia ganharam umas horas de avanço à força das águas".