Primeira unidade licenciada destinada à alimentação humana. Receitas irão financiar a reintegração social de jovens reclusos.
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A primeira unidade licenciada no país para a criação de grilos destinados à alimentação humana foi inaugurada, esta quarta-feira, no Estabelecimento Prisional de Leiria Jovens (EPLJ). Financiado pela Fundação Calouste Gulbenkian, este é um projeto que procura casar a sustentabilidade ambiental e a reinserção de reclusos, com as verbas resultantes da venda dos insetos, destinados ao fabrico de farinha, a serem canalizadas para o apoio à reintegração dos jovens.
Diogo Lopes, de 19 anos, é um dos 16 reclusos envolvidos no projeto. Conta que irá ajudar na alimentação dos grilos e que tem participado em várias atividades de capacitação e de desenvolvimento pessoal. "Tenho aprendido sobre grilos, mas também sobre empreendedorismo e inglês", revela o jovem, que acredita que está a "ganhar ferramentas" que lhe poderão ser úteis quando, dentro de 10 meses, sair da prisão.
Joana Patuleia, diretora do EPLJ, destaca a componente social do projeto, que visa "criar melhores condições aos jovens que estão a cumprir a sua pena". Esse trabalho conta com a parceria da Aproximar, cooperativa de solidariedade social que trabalha na reintegração de reclusos através de atividades de capacitação social.
Tiago Leitão, presidente da Aproximar, explica que os jovens abrangidos pelo projeto têm, durante o cumprimento da pena, formação em áreas como cidadania, empregabilidade, gestão de conflitos e de orçamento familiar, além da atividade na unidade de produção de grilos. O apoio continua após a saída em liberdade, com um programa de mentoria, que contempla ajuda psicossocial e procura de emprego.
"Este é o caminho a seguir", defende Rui Abrunhosa Gonçalves, diretor-geral da Reinserção e Serviços Prisionais, que realça o caráter "inovador" do projeto e as parcerias que o tornaram possível, sublinhando a importância de as prisões funcionarem como "sistemas abertos ao exterior".
Idealizado há cinco anos, o projeto teve de ultrapassar vários obstáculos, a começar pela ausência de "enquadramento legal" para licenciar este tipo de unidades, lacuna já ultrapassada. "Estas são as primeiras instalações em Portugal licenciadas para a produção de grilos para alimentação humana ", salienta José Gonçalves, CEO da The Cricket Farming Co, startup sediada em Leiria que está a dar os primeiros passos na produção de farinha a partir de grilos.
Pão, bolos, massas...
Os grilos são processados em farinha, que pode ser incorporada na produção de pão, massas, bolos, snacks ou barritas, "reforçando a componente proteica de alimentos ricos em hidratos de carbono", explica o biólogo Gonçalo Costa.
Quando a unidade estiver a funcionar em pleno, serão produzidos 70 quilos de grilos por dia na cadeira. São alimentados com restos de vegetais e fruta não comercializada. A zona de produção tem uma temperatura entre os 29º e os 30º graus e borrifadores de água que mantêm a hidratação dos grilos.
À margem deste projeto, foram também assinados protocolos com empresas que preveem que os reclusos façam ratoeiras, corte de peças para chinelos, colagem de etiquetas e brindes.