Identificadas nove que durante décadas, no século passado, ensinaram em casa centenas de crianças a ler e escrever.
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Luís Teixeira, 78 anos, sente uma certa emoção e nostalgia quando olha para a fotografia da mãe numa antiga escola de Murça. A Dona Marquinhas foi uma das nove mestras identificadas no concelho. Durante muitos anos do século passado receberam centenas de crianças em casa, a partir dos três anos, funcionando com uma espécie de educadoras de infância, alfabetizando, ensinando números, às vezes a fazer contas.
Luís Teixeira lembra-se de ter, com três ou quatro anos, "aprendido a escrever e a fazer contas de ouvido" quando estava com as outras crianças lá em casa. "A minha mãe chegou a juntar mais de 30", recorda.
Isabel Breia, que fez carreira como professora, também andou em casa da Dona Marquinhas a aprender a ler e a escrever. Tinha cinco anos. "Gostava muito de ir para lá, porque senão passava os dias em casa ou com a minha avó", recorda, destacando que "era muito saudável passar o tempo com outras crianças". Lembra-se que a mestra "era muito meiga, mas não permitia que se fugisse da linha".
espécie de infantário
Das nove mestras identificadas, apenas uma é viva. Tiveram um papel importante no ensino das primeiras letras e números aos filhos dos pais com posses para recorrerem aos seus serviços. Eram uma espécie de jardins de infância quando estes ainda não existiam - só apareceram em finais dos anos de 1980.
Estão todas em destaque numa antiga escola primária de Murça, que está transformada num Centro de Memória da Educação. A exposição "Das Mestras aos Jardins de Infância" engloba a "Sala das Mestras", que recria o ambiente em que estas recebiam as crianças nas suas casas: os bancos em madeira, as lousas, as escalfetas.
É uma iniciativa do Centro Interdisciplinar, Transfronteiriço e Inter-Regional de Memória da Educação, que envolve 10 investigadores das Universidades do Porto e do Minho e conta com a parceria da Câmara Municipal de Murça, no âmbito do projeto Raízes da Educação para o Futuro, que realizou investigação e intervenção cultural sobre a herança educativa de Murça.
"Eu sabia que para além de Dona Marquinhas, nascida ainda durante a monarquia, devia haver outras mestras, que serviam uma população que vivia melhor. Pusemo-nos em campo e identificámos nove desde o princípio do século XX", refere a coordenadora do projeto, Margarida Louro Felgueiras, professora da Faculdade de Psicóloga e Ciências da Educação da Universidade do Porto.
A importância das mestras na educação estava tão enraizada, que, segundo a investigadora, quando apareceram os jardins de infância "alguns pais estranharam por os filhos não levarem cadernos para casa".
O projeto tem outras áreas de atuação, como o lançamento de um livro sobre "200 anos de educação em Murça" e o levantamento das escolas Adães Bermudes (arquiteto do Estado Novo) que existem ou existiram no país.