Projetos estratégicos podem perder apoio em caso de incumprimento ou informações erradas
A Comissão Europeia enumerou os critérios que permitiram a inclusão da mina do Barroso entre os 47 projetos considerados estratégicos e avisou que em caso de incumprimento ou informações incorretas esse estatuto pode ser retirado.
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O esclarecimento da Comissão Europeia surge na sequência de uma queixa de três organizações não-governamentais (ONG), uma portuguesa e duas internacionais, contra a inclusão da mina do Barroso entre os 47 projetos estratégicos aprovados pela Comissão Europeia (CE). A associação Unidos em Defesa de Covas do Barroso, a MiningWatch Portugal e Client Earth consideram, na queixa, que CE "não avaliou corretamente os riscos ambientais e sociais da mina" do Barroso ao conceder o estatuto de projeto estratégico.
Em declarações ao JN, uma das advogadas da Client Earth considerou “muito pouco transparente” o processo de apoio à mina da Savannah. “Não sabemos o que a Comissão considerou”, disse Ilze Tralmaka. Um porta-voz da Comissão Europeia esclareceu, em resposta ao JN, que “a escolha de projetos estratégicos foi feita com base em quatro critérios definidos no Regulamento das Matérias-Primas Críticas”: Devem contribuir de forma significativa para a segurança do abastecimento da União de matérias-primas estratégicas; ser, ou ter o potencial de se tornarem, tecnicamente viáveis num prazo razoável, apresentar volumes de produção esperados e ser implementados de forma sustentável, com um nível de confiança estimado suficiente; e demonstrar que trazem benefícios transfronteiriços além do Estado-Membro da União Europeia (UE) em questão.
“Caso as condições dos projetos listados mudem, de forma que deixem de cumprir todos os critérios, a Comissão Europeia, após consultar o Conselho das Matérias-Primas Críticas e o promotor do projeto, tem o direito de retirar o reconhecimento do projeto listado, apresentando os motivos para tal”, informou a CE na resposta ao JN. “Isso também se aplica se a avaliação dos critérios de seleção tiver sido baseada em informações incorretas fornecidas na candidatura”, acrescentou um porta-voz daquela instituição.
Responsabilidades dos promotores
Na queixa apresentada, as ONG levantam dúvidas sobre o nível de informação que chegou à CE. As organizações consideram “insegura” a proposta da empresa para o armazenamento de rejeitos, dizem que as fontes de água propostas para abastecimento do projeto são “inviáveis” e que a “aprovação do local não cumpre as condições ambientais necessárias”. As organizações questionaram se a Comissão teve acesso a esta informação, considerando que se soubesse não teria considerado o projeto sustentável do ponto de vista ambiental e social.
“Os promotores dos projetos tiveram de demonstrar, na sua candidatura, o compromisso de mitigar os impactos sociais e ambientais, bem como de fomentar o desenvolvimento da economia local”, respondeu a Comissão Europeia. “Deve ser demonstrado um envolvimento significativo com as comunidades locais, e, para este projeto específico, a Comissão tem conhecimento de que foi realizada uma consulta pública em 2021”, acrescentou a mesma fonte, não esclarecendo se estava a par das tensões que têm marcado este projeto, como os processos de servidão administrativa, anúncios de expropriações e processos em tribunal. O "Jornal de Notícias" questionou também a Savannah Resources, que não respondeu.
“O que sabemos, pelo regulamento, é que a Savannah apresentou uma candidatura para a mina ser reconhecida como projeto estratégico e que isso deve incluir documentação de suporte. Mas não sabemos o que foi submetido, porque a Comissão não nos dá acesso a essa informação”, explicou Ilze Tralmaka, uma das advogadas da Client Earth, uma ONG internacional com escritórios na Europa, Ásia e América do Norte, que utiliza o Direito para combater a poluição e as alterações climáticas e proteger a natureza, em parceria com cidadãos e organizações em todo o mundo.
A mina do Barroso é um dos quatro planos portugueses, três ligados ao lítio e um ao cobre, integrados na lista "de 47 projetos estratégicos destinados a impulsionar as capacidades europeias de matérias-primas estratégicas". Além da proposta da Savannah, foi incluída a operação das minas do Romano, Montalegre, da Lusorecursos, a fábrica de processamento de lítio Lift One, proposta pela Lifthium, do grupo José de Mello e da Bondalti, para Estarreja, e projeto de extração e processamento de cobre na Mina Neves-Corvo, da Somincor.
Benefícios dos projetos estratégicos
Segundo a CE, os projetos estratégicos poderão beneficiar de um apoio coordenado da Comissão, dos Estados-Membros e das instituições financeiras para se tornarem operacionais, nomeadamente no que diz respeito ao acesso a financiamento e ao apoio para estabelecer a ligação com os compradores. Beneficiarão igualmente de disposições de licenciamento simplificadas, a fim de assegurar a previsibilidade em intenção dos promotores de projetos, salvaguardando simultaneamente as normas ambientais, sociais e de governação. Conforme o Regulamento Matérias-Primas Críticas, o procedimento de concessão de licenças não excederá 27 meses para projetos de extração e 15 meses para outros projetos. Atualmente, os processos de licenciamento podem durar entre cinco e 10 anos.
O Regulamento das Matérias-Primas Críticas (CRMA, na sigla em inglês) prevê a monitorização, prevenção e minimização dos impactos ambientais dos projetos mineiros na União Europeia, assim como dos impactos sociais adversos, promovendo a adoção de práticas socialmente responsáveis, incluindo o respeito pelos direitos humanos, dos povos indígenas e pelos direitos laborais.
Conforme o CRMA, todos os promotores de projetos são obrigados a apresentar, a cada dois anos, um relatório sobre o estado do seu projeto e a notificar a Comissão Europeia de alterações relevantes. O promotor do projeto é responsável por disponibilizar e atualizar online as informações relevantes sobre o projeto, segundo a regulamentação europeia, que também presta atenção às práticas empresariais, em defesa da transparência e de políticas de conformidade adequadas.