PS, BE e CDU votam contra, mas Porto deixa de ter regulamento para o Alojamento Local

Porto contabiliza 10 518 estabelecimentos de AL
Igor Martins / Global Imagens
Com os votos contra do PS, BE e CDU, foi aprovada a revogação do regulamento municipal para o crescimento sustentável do Alojamento Local (AL) no Porto. Para Rui Moreira, as políticas do programa Mais Habitação eliminam qualquer regulamentação municipal.
Foi Francisco Calheiros, da CDU, quem abriu a discussão do primeiro ponto da ordem de trabalhos da Assembleia Municipal do Porto desta segunda-feira. Considerando legítimas as dúvidas sobre como o regulamento para o crescimento sustentável do AL na cidade poderia conciliar-se com as medidas do programa Mais Habitação, o deputado considera que "a ação responsável a ter" seria o envio de um requerimento ao Governo com essas mesmas questões.
O deputado nota que, desde a implementação do regulamento e até ao passado dia 24 de outubro, "deram entrada 281 pedidos de registo de AL em áreas de contenção, dos quais apenas 40 foram deferidos, confirmando que a estratégia adotada tem vindo gradualmente a consolidar o objetivo de equilibrar o rácio entre o stock de habitação disponível e o número de estabelecimentos de AL existentes". Por isso, e pedindo uma atualização dos rácios em cada uma das freguesias da cidade, Francisco Calheiros considera que "as necessidades urgentes que motivaram a regulamentação do AL não desapareceram. Pelo contrário, agravaram-se".
"Nos últimos seis meses, o Bonfim teve mais 234 novos registos, Cedofeita teve mais 199 e Massarelos mais 45. O Porto fica assim, com um total de 10 518 AL na cidade, com um rácio de 10% sobre a habitação, 8% acima do rácio nacional e apenas três mil fogos abaixo do número de habitação social da cidade", acrescenta o deputado da CDU, defendendo a manutenção do regulamento que, ainda que "insuficiente", considera ser "necessário".
O presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, levantou-se no exato momento em que Francisco Calheiros abandonou o púlpito para responder de imediato ao deputado: "É extraordinário que um partido que votou contra este regulamento venha aqui com enorme topete queixar-se porque o Executivo municipal propõe revogá-lo".
Mais à frente, o deputado da CDU voltou a defender-se, esclarecendo que "sempre quis que a regulamentação acontecesse", ainda que considerando o documento insuficiente. "Mas era melhor isso que nada", sublinhou.
"Compreendemos bem que o único regulamento que vossas excelências queiram era um em que vocês determinassem que seriam os vossos camaradas a ter acesso a habitação social", atirou Moreira.
Governo "criou um alçapão", critica Moreira
"Vamos a eleições. Não me parece, sinceramente, que as vossas ideias possam vingar. Aqui, no Porto, temos de facto uma preocupação com a habitação social, atividades económicas e com os pequenos proprietários. Temos preocupação quando o Governo, que inicialmente passou competências para os municípios, que nos levaram a fazer um trabalho exaustivo para fazer um regulamento, alterou a lei. Mas é o que é", criticou o autarca.
Aliás, Rui Moreira ironiza até sobre que meios teria a Câmara para fazer cumprir a obrigação de fiscalizar os proprietários de AL, comprovando que utilizam a habitação própria para exercer a atividade pelos 120 dias estipulados no Mais Habitação.
Também o deputado do BE, Pedro Faria, considera que a revogação do regulamento "apenas servirá para tornar o negócio imobiliário ainda mais desenfreado", referindo o rácio superior a 60% na freguesia da Vitória entre o número de estabelecimentos de AL existentes e o número de habitações. Pedro Faria referiu ainda o voto contra do BE aquando da aprovação do regulamento "pelas suas exceções".
O presidente da Câmara do Porto voltou a referir que "a vontade de legislar da senhora ministra da Habitação [Marina Gonçalves], terá absorvido alguma influência desta ideia fantástica de que, para resolver o problema da habitação não pode haver privados". "Já toda a gente percebeu uma coisa: criou-se aqui um alçapão. Acabou-se a regulamentação", observa Moreira, ainda que concordando com a medida que impõe unanimidade entre condóminos para a instalação de um AL num prédio de habitação.
Para Sílvia Soares, do PSD, "o Governo quer matar o AL e os pequenos e médios empresários". Recordando o "muito trabalho" do Executivo municipal para criar um regulamento para o setor, lamenta que a "postura alheada da realidade" adotada pelo Governo "retira competências" aos municípios.
Do PAN, Paulo Vieira de Castro, afirmou que, ao entender que a "mudança legislativa governamental onera, como habitualmente, a despesa e serviços camarários", acompanharia favoravelmente a proposta. Também o Chega votou a favor.
Pela voz do deputado Agostinho de Sousa Pinto, o PS defendeu "que o Porto ganhará sempre que se conseguem equilíbrio" e considerou que "a revogação será retrocesso".
Já Raúl Almeida, do grupo independente de Rui Moreira, nota que "a revogação do documento é, acima de tudo, uma forte declaração política". O deputado aproveitou ainda a oportunidade para destacar "o contorcionismo político" de quem quer "votar contra a revogação de um relatório ao qual se opôs".
Setor do AL apela a que "não matem" a atividade
Já no final da sessão, no período de intervenção dos cidadãos, David Almeida, da Associação do Alojamento Local do Porto e Norte, considerou que o setor "está a ser escandalosamente substituído por empreendimentos e apartamentos turísticos, precisamente nas mesmas zonas onde já existia uma proibição de abertura de novas unidades de AL".
Isto, "sem que ninguém se manifeste ou insurja enquanto quarteirões inteiros e prédios inteiros são açambarcados, alterando-se o seu respetivo uso". O empresário pede, por isso, "que não matem a atividade do AL".
"Alimentamos a economia local e circular, promovendo os pequenos negócios e imensas atividades que gravitam em torno do AL, nomeadamente serviços de lavandaria, limpeza, restauração, tours, etc", enumerou.
Apesar de o Executivo já ter saído da sala, David Almeida questionou ainda se os novos estabelecimentos turísticos vão servir de substitutos ao serviço de AL recordando, por outro lado, a reabilitação urbana feita à boleia do setor, que mudou "a cidade granítica e cinzenta".
"Lançamos um apelo para que considerem o nosso setor com a dignidade e o respeito que este merece. O mesmo respeito que devotámos a esta cidade, contribuindo ativamente para o seu crescimento e renovação. É imperativo que reconheçam o AL não como um entrave, mas sim como um parceiro vital deste Porto renovado e acolhedor", concluiu.
