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Numa altura em que a globalização é um dado adquirido em muitas áreas, a cozinha não escapa à regra. Se na cidade do Porto se concentram restaurantes para todos os gostos e com muita variedade, também é possível provar sabores dos quatro cantos do Mundo na periferia. Por enquanto, as opções não são assim tão abundantes, mas é uma tendência em crescimento.
O JN foi conhecer de perto o Paladares de Goa (Maia), o Chilli's Tex Mex (Vila do Conde), o Mineirão (Gaia) e o Thamel (Matosinhos), para perceber os segredos dos vários tipos de culinária e os truques para combater o afastamento do centro do distrito.
Das especiarias que dominam a cozinha goesa, à vida colorida traduzida na culinária mexicana/texana, passando ainda pela cultura traduzida através do rodízio brasileiro e finalizando com os ingredientes diferenciadores do Nepal, são vários os pontos que distinguem os vários tipos de estabelecimentos, que funcionam como uma alternativa, cada vez mais, fiável à tradicional e característica cozinha portuguesa.
Paladares de Goa: especiarias em força para recuperar as tradições goesas
Escondido numa rua secundária perto do centro da Maia encontramos o Paladares de Goa. Um restaurante de comida goesa que, conforme explica ao JN o proprietário e Chef, Roberto Sousa, oferece uma fusão de comida portuguesa e indiana, caracterizada pelas especiarias que dão uma nova vida aos pratos.
Inaugurado há 16 anos, o estabelecimento nasceu da paixão do dono pela cozinha e pelo desejo de perpetuar o legado da família. A escolha pela cidade da Maia deu-se pelo elevado custo de arrendamento de espaços no centro do Porto, tendo-se revelado uma aposta certeira.
"Eu considero este distanciamento do Porto uma vantagem. Éuma forma das pessoa sairem do grande centro, conhecer novas localidades e distanciarem-se da correria do dia-a-dia. E eu costumo dizer que não importa o local onde o restaurante está, se ele prestar um bom serviço e qualidade, as pessoas procuram o espaço", acredita Roberto Sousa.
E se os clientes são a alma do sucesso, a sua captação foi um processo gradual e que ainda continua em desenvolvimento. Mesmo que Roberto já tenha de recusar clientes devido à sobrelotação das reservas, houve alturas em que o negócio não corria assim e a razão está relacionada com as ideias pré-concebidas sobre este tipo de culinária.
"As pessoas têm a ideia que a cozinha indiana tem que ser picante. Não, faz parte da cozinha goesa, mas é um picante que a pessoa não perde o paladar. No fundo, ele vai dilatar as papilas gustativas e vai poder saborear a comida de outra forma. Sentir as especiarias, sentir a textura e não ficar logo a pedir um extintor", explicou o chef.
Chilli's Tex Mex: fusão de dois países que resulta numa explosão de sabores
Fundado em 2016, o Chilli's Tex Mex tem uma localização privilegiada, em frente à praia, em Vila do Conde. Nem sempre foi assim, uma vez que o estabelecimento original era na Póvoa de Varzim, mas a vasta adesão do público obrigou a sonhar mais alto e à procura de novas instalações.
Tamara Fernandes é a gerente do espaço, que procura oferecer uma mistura entre comida do México e do Texas (Estados Unidos da América). Esta foi uma lacuna detetada no mercado no Norte de Portugal e que, como o tempo veio a provar, se revelou um sucesso.
À entrada no restaurante somos logo bombardeados por uma explosão de cores, que se traduzem nos pratos através dos sabores. No entanto, nem tudo foi fácil na aplicação deste conceito.
"Inicialmente não foi fácil arranjar os produtos, porque não havendo procura, também não há material. Foi uma luta muito grande da nossa parte, até porque trabalhamos com ingredientes frescos, mas depois conseguimos engatar tudo e, de repente, já existem imensos fornecedores, imensas coisas e muita escolha", revela Tamara.
Para a gerente do Chilli's Tex Mex a presença em Vila do Conde "é uma vantagem", até porque lhe permite ser" única no tipo de cozinha que oferece", uma vez que não há nada similar à volta. Atualmente já há muitos clientes de Guimarães, do Porto e de outras localidades que vão a Vila do Conde à procura de "uma noite diferente".
"Houve uns clientes latinos que ouviram a música a partir da rua e, quando lhes expliquei o conceito, disseram: 'ok, daqui já não saio'. E é muito bom poder dar às pessoas um bocado da sua cultura, que acabaram por perder um pouco quando saíram do seu país", concluiu.
Mineirão: toque de samba com foco na qualidade do produto
Chegando ao cais de Gaia encontramos o Mineirão. O "último resistente" em termos de restaurantes neste emblemático local, que ali serve clientes desde 2003, até porque, entretanto, já todos os estabelecimentos originais foram substituídos.
A gerência liderada por José Oliveira, assumiu os destinos em 2009, proporcionando uma experiência de 'all you can eat', como já se vê pouco no Norte.
No Mineirão o foco é a culinária brasileira, onde a qualidade das carnes, aliada à estrela que é o feijão, fazem as delícias dos clientes. Embora tenha muitos portugueses, é também o refúgio de vários brasileiros, que ali procuram matar as saudades do seu país.
A opção por este tipo de cozinha prendeu-se com o desejo de dar sequência ao que já estava a ser feito pela gerência anterior, além da paixão de José Oliveira pelo Brasil, que foi motivo suficiente.
Sabendo que a concorrência específica não é assim tanta, até porque o conceito de rodízio "é cada vez menos usual", o gerente também não encontra problema com outro tipo de restaurantes na 'disputa' pelos clientes.
"Acredito que dá para todos. Cada um no seu espaço, não temos sentido muita competição. Cada um faz o trabalho à sua maneira. Eu acho que acima de tudo tem que haver qualidade, pois quando há os restaurantes trabalham", assegura.
E no que toca à localização, José Oliveira sente-se um "privilegiado" por trabalhar no cais de Gaia e não encontra problemas nenhuns na distância ao centro do distrito. "Tendo estacionamento e bons acessos, não me parece que estar longe do Porto seja uma desvantagem".
Thamel: mistura asiática com influência maior do Nepal
Quem não gosta de almoçar à beira-mar? Esta pergunta deu o mote ao Thamel para abrir um novo estabelecimento em Matosinhos, junto à praia, que complementa o restaurante-base que está situado no centro do Porto.
O nome provém de um bairro de Kathmandu, capital do Nepal, que é a principal influência da cozinha do Thamel. Mas não fica por aqui esta mistura de ideias, uma vez que os pratos também têm um toque do sudoeste asiático, com nuances da Tailândia e da China.
Para o responsável pela marca, Tiago Henriques, o fator diferenciador está nos condimentos, mas também no uso massivo do wok, que "proporciona à comida uma temperatura diferente na confeção", destacando-se à base de massas e especiarias.
A abertura do primeiro local deveu-se à identificação de uma lacuna pelo dono, que tem ascendência asiática. "Quando veio a Portugal apercebeu-se que havia pouca oferta e não encontrou nada que o cativasse. Por isso, optou por abrir aqui um restaurante ao seu gosto", explicou o responsável.
Quanto às motivações para a abertura deste espaço são similares, uma vez que o facto de Matosinhos ser conhecido pelo peixe dava pouca abertura para a afirmação de outro tipo de restaurantes. Por isso, devido ao sucesso do Thamel Porto, fez sentido apostar noutra cidade, até pela expansão da marca.
A opção pela cidade matosinhense pode ter sido o início de um plano mais elaborado de divulgação da cozinha asiática.
"No Porto já chegamos a muita gente e agora, estando em Matosinhos, conseguimos estar cada vez mais presentes no Grande Porto. Obviamente gostaríamos de estar em mais locais, mas vamos ver o que o futuro nos reserva", concluiu Tiago Henriques.