Parlamento e Governo defendem reativação de troço da linha do Douro, mas falta dinheiro. População não acredita.
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Duas semanas depois de a Assembleia da República se ter manifestado em bloco a favor da reabertura da linha ferroviária do Douro entre Pocinho e Barca d"Alva, o ministro das Infraestruturas afinou pelo mesmo diapasão. Mas avisou que é preciso "encontrar dinheiro" para financiar uma obra com um custo estimado superior a 40 milhões de euros. Quem vive na aldeia fronteiriça deixou de acreditar que vai voltar a ver comboios ali, onde não apitam desde finais de 1988.
A reabilitação dos 28 quilómetros de via-férrea entre Pocinho (Vila Nova de Foz Côa) e Barca d"Alva (Figueira de Castelo Rodrigo) é defendida há anos por autarcas durienses e outras instituições regionais, mas nunca antes reuniu tanto consenso.
Ao JN, o Ministério das Infraestruturas e Habitação explicou que "o Governo vai avançar com o estudo de viabilidade para a reabertura da linha". É um sinal. Continuá-la até Salamanca, em Espanha, é que se afigura mais difícil. O ministério liderado por Pedro Nuno Santos explica que "a possibilidade de reabertura da linha do lado espanhol foi levantada por várias vezes nos diversos contactos, tendo sido reafirmada a posição de que não existe interesse [por parte de Madrid] na reativação dessa ligação internacional".
Povo descrente
Em Barca d"Alva já se perdeu a esperança. "Quando fecharam a linha fez-me muita falta, agora, se não reabrir já não me importa", refere Luís Patrício, antigo ferroviário natural daquela aldeia. "Em ano de eleições, abrem sempre coisas", ironiza.
Sente-se mágoa na voz deste homem de 79 anos. Recorda os dias negros de outubro de 1988. "Vieram cá uns meses antes festejar os 100 anos da linha e a seguir encerraram-na". A aldeia perdeu muito. Só em serviços de segurança e fiscalização "foram mais de 100 pessoas ao ar".
Sentado no muro onde também está Patrício, Alfredo Mendo é perentório: "Não acredito. Porque não temos peso político na região para forçar a reabertura". Menos pessimista, Nelson Guerra confia que "a linha vai ser reativada apenas entre Pocinho e Barca d"Alva". Isso agradaria ao pai, Amadeu, que tem um restaurante. "Faz muita falta para quem tem de se deslocar ao Porto".
Mas não só os portugueses desejam a linha reaberta. Eugénio Rodriguez García é o empresário espanhol que gere as moradias do Douro Internacional, junto à praia da Congida, em Freixo de Espada à Cinta. E gostava de a ver continuar para Espanha. Até lhe dava jeito. Mas vê um problema no outro lado da fronteira: "Em maio vão inaugurar uma ecovia no antigo corredor ferroviário. Dizem que é a maior da Europa. Isto demonstra que o Governo espanhol não tem interesse na linha".