"Tenho tatuagens e não mudou nada em mim": a arte de transformar sentimentos em gravuras na pele
São 400 os tatuadores que, este fim de semana, enchem o Pavilhão Multiusos de Gondomar, para mostrar a arte de gravar na pele. A 8ª edição do “Oporto Tattoo”, que termina hoje, recebeu centenas de pessoas nos últimos dois dias. O melhor trabalho receberá uma mão a segurar uma máquina de tatuagem, em filigrana.
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Enquanto tatua um retrato de McGregor na coxa de Vítor Vaz, Márcio Pratas, que venceu o prémio “Best of the day”, na sexta-feira, conta que a “satisfação” dos clientes, que recebe diariamente, é a verdadeira recompensa pelo trabalho que faz. A 8.ª edição do “Oporto Tattoo”, que começou na sexta-feira e termina hoje, junta tatuadores de vários cantos do mundo: Portugal, Espanha, Argentina, Colômbia, Rússia…
Pelos corredores, circulam pessoas de várias idades, de diferentes nacionalidades, famílias inteiras e, até, bebés de colo. Alguns, curiosos, param a admirar a arte de quem transforma desejos e sentimentos em gravaduras na pele. Outros, mais corajosos, acomodam-se dentro das "estúdios" montados e eternizam imagens no corpo. A primeira vez que Vítor Vaz fez uma tatuagem foi em 2020, na Suíça, e com o Márcio Pratas. Desde aí, nunca mais parou e a escolha do tatuador é sempre a mesma. "Tenho [tatuagens] nos dois braços, esta na perna, tenho muitas", diz o bracarense, que já nem as consegue contar mas, garante que a cara do McGregor "não será a última".
A primeira convenção realizou-se há dez anos e só foi interrompida pela Covid-19. Numa década muita coisa mudou, menos o conceito da "Oporto Tattoo". “Temos sido melhores de ano para ano. Queríamos que [a convenção] fosse “family friendly”, especialmente para desmistificar este preconceito da tatuagem, de que quem é tatuado é porque é bandido, quem é tatuado é porque foi preso. Temos aqui pessoas de todos os estratos sociais, mas todos gostam da tatuagem”, afirma Fernando Rocha, representante da organização.
Tatuador há cerca de 13 anos, Márcio Pratas nunca falhou uma edição. "Quando comecei, há dez anos, havia muitas pessoas, de várias áreas e de estatutos sociais, para quem era impensável fazer tatuagens. Hoje em dia, se procurarmos aqui na convenção, vamos ter aí todo tipo de profissões", afirma o dono do estúdio Addiction Skin Tattoo.
O significado das tatuagens
Em cada dia da convenção, os tatuadores podem concorrer por uma categoria e, dentro de todos os vencedores, um é escolhido como o melhor do dia. Um dos três melhores trabalhados do congresso ganha a mão em filigrana, no valor de dez mil euros. A primeira vez que João Morais, de 29 anos, venceu o concurso foi em 2016. Na altura era, ainda, novo no mundo das tatuagens e garante que o prémio foi “muito bom para a carreira”.
“Para nós, artistas, é apenas um reconhecimento, uma motivação, mas as pessoas que seguem o nosso trabalho sentem-se mais confiantes”, afirma. O tatuador, que tem um estúdio em Gaia - "Morais Tattoo Studios" -, venceu novamente a convenção, em 2023. “As convenções fazem-nos crescer bastante. Partilhar ideias com outros tatuadores, ver técnicas ao vivo, materiais que são utilizados, isso também nos faz evoluir muito e para quem está a começar acho que é importantíssimo”, sublinha.
Quando começou a trabalhar como tatuador, numa brincadeira de adolescente, os pais não tinham a melhor ideia sobre tatuagens. Hoje, isso já mudou e João até já conseguiu tatuar a mãe. "Tenho tatuagens, tenho brincos, veem que isso não mudou rigorosamente nada em mim, vê que eu sou uma pessoa talvez melhor que aquilo que eu era", sublinha.
Tanto Márcio como João, que estão em filas opostas dentro do multiusos, trabalham com realismo e retratos, o que, às vezes, "desperta mais emoções". "Quando, por exemplo, alguém quer homenagear alguém que faleceu, principalmente quando é um filho, há sempre uma carga emocional muito grande no trabalho", explica Márcio Pratas, de 39 anos. Nem sempre há um significado associado à tutuagem, às vezes é apenas arte. "Mas, quando uma tatuagem é feita com significado, o risco é muito mínimo de se arrependerem mais tarde", garante João Morais.
Para Ana Chaira, de 25 anos, as tatuagens têm sempre um significado: são feitas pelo irmão, Nuno Chaira. Com uma perna estendida, Ana observa o irmão enquanto este lhe desenha "Deadpool & Wolverine": "para mim uma tatuagem tem que ser algo com que tu te identifiques, não precisa de ser algo sentimental", diz a jovem.