Foi alterado há seis anos e tende a deformar-se. Relatório preliminar da investigação realça que cedeu no ponto de fixação no trambolho.
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O tipo de cabo usado no ascensor da Glória pode estar na origem do acidente que, há 10 dias, vitimou 16 pessoas e provocou ferimentos a outras duas dezenas, em Lisboa. O relatório preliminar do Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves e de Acidentes Ferroviários (GPIAAF), citado pelo jornal "Expresso", aponta ainda para falhas no sistema de travagem. O presidente da Câmara de Lisboa, que tutela a Carris, a entidade que opera o elevador, pede que não se tirem conclusões precipitadas (ler texto ao lado).
Segundo o documento, que teve em conta a análise dos destroços no local, "o cabo que unia as duas cabinas cedeu no seu ponto de fixação dentro do trambolho superior da cabina nº 1", pelo que este é um dos aspetos ao qual está a ser dada particular atenção. O relatório final, que é aguardado ao fim de 45 dia, irá analisar, entre outros aspetos, "o tipo de cabo e a sua fixação nos trambolhos, controlos de qualidade da execução e receção", assim como o "mecanismo de desligamento entre o cabo e o trambolho, com uma análise da condição da fixação do cabo nos trambolhos e da sua execução".
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Há seis anos alterou-se o tipo de cabo usado, que passou de um totalmente em aço para um formado por seis cordões de aço com "alma" (núcleo) em fibra, provavelmente polimérica (plástico). Mesmo que tenha a mesma classificação em termos de resistência, o seu comportamento difere, sobretudo quando é fixado no trambolho, pois deforma-se de forma irreversível e perde resistência no aperto. No entanto, não se procedeu a outras alterações no sistema de fixação, para corresponder às características do novo tipo de cabo.
Segundo Pedro Amaral, especialista em Engenharia de Materiais do Instituto Superior Técnico, "ao longo do tempo, aquela "alma" vai ter um comportamento que vai deformar-se", mesmo que não se consiga antever com facilidade através da observação visual. A solução mais viável para aquela situação seria "ter um único material de uma única rigidez, em vez de um com rigidez de aço e depois de um polímero, que pode levar a dificuldades de compatibilização de materiais, dilatações, etc., que vão ocorrendo ao longo do tempo", reforça, em declarações ao JN.
Travagem sem eficácia
No dia do acidente, quando o cabo cedeu, o guarda-freio acionou o travão pneumático e o travão manual. Mas, "na configuração existente, os freios não têm a capacidade suficiente para imobilizar as cabinas em movimento" quando não estão ligadas pelo cabo, refere-se no relatório preliminar. Não constituem, por isso, "um sistema redundante" capaz de parar os veículos em caso de falha no cabo.
Em estudo está, ainda, a possibilidade de existir óleo em excesso que possa ter afetado um dos sistemas de freios, uma hipótese que surge após observação das imagens do dia do acidente.
Moedas contra conclusões precipitadas
O presidente da Câmara de Lisboa pediu, ontem, que "não se retirem conclusões precipitadas" sobre as causas do acidente com o ascensor da Glória, que está ainda a ser investigado. Carlos Moedas disse que é "verdade que há uma mudança de um tipo de cabo há seis anos", altura em que estava na Carris outra administração, sendo este um facto que "vai ter de ser investigado". Mas, agora é preciso "deixar a investigação decorrer" e não tirar "conclusões precipitadas". "É muito importante continuar a investigar", reforçou o autarca, prometendo que se irá "investigar até à última consequência".