Filas são a norma. Confusão com encomendas levou Câmara a criar plano de logística urbana.
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Circular no Porto de carro já é novamente um pesadelo. Os condutores veem-se diariamente submersos num tráfego que parece não ter fim. As ruas do centro, as pontes sobre o Douro, a VCI, a A4, a A3 e a A28 enchem-se de carros, culminando num entupimento geral da cidade. Em Lisboa, o cenário não é diferente. "A mobilidade dos portugueses está praticamente igual ao valor pré-pandemia de setembro de 2019", confirma a PSE, empresa especialista em análise de dados.
Das dezenas de obras espalhadas pelo Porto que complicam a circulação destacam-se as de construção das novas linhas de metro. Na zona da Praça da Galiza, por exemplo, verificam-se grandes constrangimentos.
Entre os motivos para o regresso do trânsito está o medo que a pandemia criou, que mantém muitas pessoas afastadas dos transportes coletivos, e as encomendas online. As compras digitais traduziram-se na proliferação de carrinhas de entrega de encomendas pela cidade. Tanto que, conforme sublinhou ao JN a Câmara do Porto, foi criado um "plano municipal de logística urbana sustentável" para mitigar esses impactos.
Dos estafetas inquiridos pela Autarquia, 69% admite estacionar nos passeios, sendo essa situação umas das causas dos constrangimentos rodoviários. O JN tentou ouvir os responsáveis municipais pelo trânsito, mas não foi possível.
Para Paula Teles, presidente e fundadora do Instituto de Cidades e Vilas com Mobilidade, o cenário é de regresso ao passado: "Voltámos a 2019". "Deparamo-nos com as pessoas que já andavam de carro, mais aquelas que até usavam o transporte público, mas que por alguma insegurança ainda devido à covid-19, têm receios e então não arriscam", clarifica, verificando que "isso traz um trânsito adicional".
uma hora para sete km
Sérgio Moreira, taxista no Porto há cinco anos, diz que na última semana demorou uma hora para chegar ao Carvalhido desde a rotunda do Freixo (sete quilómetros). "O trânsito está igual ao que era antes da pandemia. E sim, algumas pessoas já disseram que chamam um táxi para não andar de autocarro ou metro", nota.
A somar ao trânsito infernal, o motorista observa que os corredores bus, onde os táxis podem circular, não funcionam como deveriam. E o estacionamento em segunda fila também complica. "Não consigo percorrer a Rua de Camões sem ter de me desviar dos carros que lá estão parados indevidamente", refere, criticando "a falta de policiamento". Sérgio aponta a Ribeira, a Avenida Fernão de Magalhães e o Campo 24 de Agosto como alguns dos pontos mais críticos do trânsito.
"oportunidade perdida"
Paula Teles olha para o período de confinamento como "uma grande oportunidade" perdida. "De forma geral, os municípios não deram sequência a uma viragem em matéria de descarbonização", nota a especialista em mobilidade, afirmando que o facto de as ruas terem ficado vazias poderia ter sido aproveitado para "redesenhar" e "planear" as cidades.
"Na próxima década, temos de preocupar-nos com a mobilidade pedonal. Ela já atinge hoje o segundo modo mais importante do Porto", sublinha (o primeiro é o carro e os transportes estão em terceiro). Com o número de deslocações a subir de ano para ano, "é preciso perceber para onde as pessoas vão e redesenhar corredores verdes". Sobre o trânsito de pesados, refere que a retirada de portagens na A41 para desviá-lo da VCI não será solução: "Não é uma alternativa competitiva. A distância é muito maior".
Plano de mobilidade
Paula Teles nota que as câmaras do Porto e de Lisboa não têm um Plano de Mobilidade Urbana Sustentável. O documento é exigido pela Comissão Europeia, mas o Governo português ainda não estará a obrigar os municípios a desenvolvê-lo, refere a especialista. "Está na Assembleia da República uma proposta de lei para a sua obrigatoriedade. É como se fosse o Plano Diretor Municipal da mobilidade".
Maior flexibilidade
A empresa PSE nota "um aumento ligeiro do tráfego nos períodos tradicionalmente "de vazio". Ou seja, de manhã, entre as 10.30 horas e as 12.30 horas e à tarde, entre as 15 horas e as 17 horas. Uma situação "que mostra uma maior flexibilidade da mobilidade", conclui a análise.