O presidente da Câmara de Viana do Castelo, Luís Nobre, defendeu hoje que uma piroga, classificada como “Tesouro Nacional”, que foi cedida para exposição ao município de Caminha, deve ser devolvida àquele concelho.
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O autarca entende que, pelo facto de aquela embarcação ter tido atividade, na segunda metade do séc. X e primeira metade do séc. XI, no rio Lima, e sido exumada, na década de 80 do século passado, do leito daquele curso de água, em Viana do Castelo, esta pertence ao município. E, aludindo a declarações do presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, sobre a reparação às antigas colónias portuguesas, adiantou que, por isso, fará diligências junto da Direção-Geral do Património e da Câmara de Caminha para que aquela “Piroga Monóxila”, regresse à origem.
“Fala-se hoje muito de devolver património que trouxemos das ex-colónias e aquele é património de Viana do Castelo. Se estão à espera que eu afirme isso, eu afirmo: se é património de Viana faz sentido ficar em Viana”, disse Luís Nobre aos jornalistas, no final da reunião do executivo municipal, esta terça-feira, onde foi questionado pelo vereador da oposição, Paulo Vale (PSD), sobre o facto de a piroga ter sido entregue a Caminha.
“Se estamos a desafiar a sociedade portuguesa para reinterpretar o que foi a nossa relação com as ex-colónias e até a possibilidade de devolver ou compensar valores patrimoniais que talvez estejam na nossa posse indevidamente, então porque é que nós, em pleno século XXI, não fazemos a nossa interpretação interna, que é o património ficar onde efetivamente tem relação histórica, estrutural, funcional? É isso que parece que aqui está em causa”, declarou o autarca, considerando que “a solução passa por dialogar com a Direção-Geral de Património e com o município de Caminha também. Sentarmo-nos, negociarmos e encontramos uma solução que dê sentido. Para nós o sentido é que um achado no nosso concelho deve ficar cá”.
Luís Nobre afirma não ter tido qualquer conhecimento do processo de cedência da referida piroga a Caminha.
“Fomos confrontados com esta nota. É um assunto que se retoma de 2020. Interessa retomar e interpretar as razões que estão associadas, se é possível encontrar soluções lógicas, que façam sentido”, comentou, sublinhando que “faz sentido que as pirogas, tendo surgido em Viana, sendo património com valor nacional de Viana do Castelo, devam ficar cá. Parece-me que isso é óbvio, mas parece que há outros entendimentos. Eu não estou convencido”.
Em causa está a primeira piroga do rio Lima, que vai ser exposta ao público no Museu Municipal de Caminha. A câmara local aprovou na sua última reunião do executivo um contrato com o Instituto Público do Património Cultural para a cedência temporária daquela “Piroga Monóxila”, que remontará “à segunda metade do séc. X e primeira metade do séc. XI” e está classificada como “Tesouro Nacional”.
“A piroga em causa foi classificada, conjuntamente com mais cinco pirogas, como de interesse nacional, com a designação de “Tesouro Nacional”. Para poder ser exposta em Caminha foram estabelecidos vários requisitos, designadamente quanto à sala de exposição e medidas de segurança”, informa aquela autarquia em comunicado, divulgado hoje, referindo que, para expor a peça, “há condições ambientais, de humidade relativa, temperatura e iluminação, assim como a ausência de vibração e de poluentes atmosféricos que terão de ser cumpridos”.
Ainda de acordo com a Câmara de Caminha, “trata-se, de facto, do regresso do exemplar, após várias peripécias e um longo processo”, em que “a piroga n. 1 do Rio Lima foi exumada do leito do rio a 2 de março de 1985 e transportada para Viana do Castelo, ficando guardada num armazém pertencente à capitania local, onde passou despercebida”.
“Foi então que o interesse e esforço de Raúl de Sousa, à época funcionário da Câmara municipal de Caminha e pertencente ao grupo organizador do Museu Municipal de Caminha tomou conhecimento da mesma, adquiriu-a, e providenciou a sua transferência para o local do futuro Museu Municipal de Caminha”, descreve o comunicado, adiantando que, segundo “conta o responsável atual pelo museu, Sérgio Cadilha, devido às deficientes condições preventivas do depósito, a piroga foi transferida inicialmente para o Museu Monográfico de Conímbriga, e depois para as instalações do Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática, em Lisboa, onde iniciou o processo de consolidação com vista à secagem e estabilização em ambiente seco”. O tratamento da Lima 1 acabou por ser concluído “no laboratório do Museu Nacional de Arqueologia Subaquática (ARQUA), em Cartagena, Espanha”. E o município de Caminha “acabou por lhe perder o rasto”, até que entretanto foi classificada “Tesouro Nacional”, e a Câmara empreendeu “esforços para que a peça pudesse regressar a Caminha”.