Viana transforma matadouro em edifício “inteligente”, o primeiro do país alimentado a hidrogénio
O antigo matadouro de Viana do Castelo, devotado e com quase um século de existência, vai ser reabilitado para acolher um "centro de inovação internacional" instalado num edifício "inteligente", que será o primeiro em Portugal totalmente alimentado a hidrogénio.
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O projeto "Viana STARTS", o único aprovado a nível nacional, no âmbito do programa Iniciativas Urbanas Europeias (European Urban Initiative), foi apresentado publicamente esta quarta-feira.
Representa um investimento superior a seis milhões de euros, co-financiado pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) em quase cinco milhões, e deverá estar concluído, em termos das suas instalações físicas, em dezembro de 2026. A reconversão do velho edifício num futuro espaço vocacionado para a tecnologia e artes já começou a dar os primeiros sinais, com a criação, nas suas paredes, de um mural de grandes dimensões com o nome "Do Matadouro ao criadouro" - uma obra gráfica que já começou a atrair a curiosidade da população local e dos turistas.
Em termos de soluções energéticas, segundo o investigador João Abrantes, diretor da Unidade de Investigação em Materiais, Energia e Ambiente para a Sustentabilidade, Prometeus, do Politécnico de Viana do Castelo, o antigo matadouro deverá integrar "uma solução embrionária a nível mundial", com alimentação integral a hidrogénio produzido localmente "num circuito autónomo".
Sistema começou em missões da NASA
"Este sistema começou nos anos 60 com a NASA nas missões Apollo, mas nunca saiu dessa esfera do aeroespacial. Desde há uns dez ou 15 anos, tem evoluído bastante. E há menos tempo tornou-se num assunto que está na ordem do dia e os projetos estão a nascer. Que eu conheça em Portugal, este é o primeiro projeto num edifício público com esta solução de eficiência energética", afirmou João Abrantes, indicando que, internacionalmente, há outros projetos na área da mobilidade, envolvendo automóveis e autocarros.
"A Toyota é uma das empresas que está muito à frente nisso, mas no nosso país este é um dos projetos que está a liderar. Em Portugal, conheço algumas instalações-piloto em algumas universidades e politécnicos, mas são coisas à escala laboratorial. Com esta escala, um edifício completo não conheço", asseverou o investigador, explicando que se trata de uma solução capaz de suprir "falhas de produção de energias verdes ou rutura completa de energias de rede".
"O hidrogénio é um veículo de armazenamento de energia eficiente e o que nós tentamos fazer é produzir hidrogénio verde, usando as energias renováveis quando estas estão a ser produzidas em excesso, relativamente ao que é necessário para o edifício", descreveu. "Aproveitamos esse excedente e com eletrolisadores produzimos hidrogénio verde, que, em situações de necessidades energéticas, é transformado novamente em eletricidade com pilhas de combustível e alimenta o edifício".
Uso de materiais naturais
Em termos de estruturas, o "Viana STARTS" implicará a reabilitação total, mantendo a traça original do imóvel, que ao longo de mais de seis décadas (1926-1990) foi palco de abate de animais para consumo humano, e ainda construção de edifícios novos adjacentes, com recurso a materiais sustentáveis.
Segundo explicou esta quarta-feira Nuno Simões, da ITECONS, será para "manter ao máximo a construção antiga", mas de resto a obra irá integrar os conceitos do "New European Bauhaus", de "estética, beleza, sustentabilidade e inclusão". Isso passa pela utilização de "materiais naturais e aproveitamento de resíduos na estrutura", desde cortiça, a madeiras, vidro de baixa pegada carbónica, lã de ovelha e mineral, blocos de palha e cânhamo. As novas construções terão "coberturas verdes" e as soluções acústicas e de isolamento térmico, serão inovadoras.
O projeto, com prazo de concretização de quatro anos (em 2027 encerra o financiamento), agrega, além da Câmara de Viana do Castelo, vários parceiros, entre eles a Associação Juvenil de Deão (AJD), com objetivo de envolvimento da comunidade local, a ITECONS, a quem cabe a coordenação de trabalhos para integração de soluções inovadoras para recuperação do matadouro, a INOVA, que irá desenvolver experiências piloto, a Associação Empresarial de Viana do Castelo e o IPVC. E ainda "parceiros de transferência", selecionados como "fonte de inspiração", as cidades de Brescia, em Itália, de Brest, em França, e de Ferrol, em Espanha.
Ricardo Rego, vereador da Inovação da câmara de Viana do Castelo, afirmou hoje que este será "um transformador", criado a partir de "património devoluto", e que resultará num "centro de inovação de nível nacional e internacional", com tecnologia de ponta e capaz de congregar "cientistas, engenheiros, criativos, artistas e demais agentes".
Já o autarca Luis Nobre destaca "o prestigio para a cidade" que será "integrar um movimento inspirador para o mundo". "Tenho uma grande esperança neste projeto, que acredito nos fará voltar a ser referência na Europa, no nosso país e no Mundo, porque a nossa história está à altura do mundo", disse.