GNR sinalizou 45 563 pessoas em todo o país. Estabilização do número esconde várias realidades.
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É um país a cumprir trajetórias distintas aquele que se esconde sob a aparente estabilização - com apenas mais 47 casos de 2017 para 2018 - do número de idosos a viver sozinhos ou em situação de vulnerabilidade sinalizados pela GNR.
Se em distritos como Braga, Leiria e Évora se regista uma descida que chega a ultrapassar as 300 pessoas, e noutros, como Porto e Lisboa, as diferenças são residuais, nos de Setúbal e Vila Real o aumento foi na ordem das centenas. Este último destronou mesmo a Guarda no topo da tabela.
Ao todo, a GNR sinalizou em todo o país, em 2018, 45 563 pessoas com mais de 65 anos, mais de metade das quais por residirem sozinhas. São, porém, as 3123 que acumulam aquela condição com o isolamento que mais preocupam aquela força, por, frisa ao JN o major Pedro Ramos, estarem numa situação de "especial vulnerabilidade".
Variações por explicar
Por compreender fica o porquê do cenário encontrado pela GNR no levantamento realizado, em outubro, no âmbito dos "Censos Sénior 2018", uma vez que esta operação visa apenas uma "atualização de dados".
O militar aponta, ainda assim, a possível ocorrência de falecimentos, a sinalização por parte de outras entidades dos idosos anteriormente identificados e a transferência destes para casa de familiares como potenciais causas para a diminuição verificada em alguns distritos.
O facto de, ano para ano, existirem mais pessoas a cumprir 65 anos, passando, por isso, a encaixar na população sinalizada é, de resto, uma das justificações indicadas ao JN por fonte da GNR de Vila Real para, em sentido contrário, explicar o aumento de casos registados naquele distrito transmontano.
Além disso, diz, "há sempre novas sinalizações que o efetivo, ao longo do seu patrulhamento, vai detetando" durante todo o ano. Existe, igualmente, "um trabalho de colaboração com outras instituições que se aprofunda e que leva a sinalização de casos não detetados anteriormente".
A partir de agora, todos os idosos sinalizados serão visitados com regularidade, adianta a GNR.
"Tenho medo, mas já me habituei"
Isilda da Conceição vive numa aldeia isolada da serra do Alvão, no distrito de Vila Real, onde as casas habitadas se contam pelos dedos de uma mão. Outrora repleta de habitantes, as ruas da aldeia estão agora desertas. "A vizinha mais próxima está fora o dia todo e o resto vive mais afastado. Há dias que não se encontra viva alma pela aldeia. Tenho medo de estar sozinha, mas já me habituei a viver assim", conta ao JN, enquanto alimenta as galinhas.
É assim que, aos 72 anos, Isilda passa os dias. Alimenta os animais, pasta a única vaca que lhe resta, cultiva um pedaço de terra e espera pelo telefonema dos filhos que vivem no Luxemburgo. Viúva há 30 anos, a idosa já se afligiu mais com o isolamento. "Antes, não gostava de estar assim tão sozinha, mas já estou habituada e gosto disto, porque é sossegado. Tenho sempre receio, mas é na minha casinha que me sinto bem", sublinha.
"Fora o carteiro e o padeiro, só passa aqui gente que não se sabe quem é e fico sempre de pé atrás", lamenta a idosa, que já foi assaltada "há um par de anos". "Comecei a gritar que chamava a Guarda e foram embora, mas tive medo, porque ninguém ia ouvir-me por muito alto que gritasse", afirma.
Dorme tranquila, mas garante que fecha as portas "bem fechadas". "Antigamente, tinha sempre tudo aberto, mas agora é preciso ter muito cuidado".
O receio faz Isilda pedir aos militares da GNR que apareçam mais vezes na aldeia. "Não é costume vê-los, mas era bom que passassem por aqui para me sentir mais segura", remata.