Vai ser assim todos os meses. O Convento Corpus Christi e a Casa-Museu Teixeira Lopes, em Gaia, passaram a ser espaços de fruição cultural também para surdos, com visitas orientadas por uma tradutora de língua gestual portuguesa. A próxima está agendada para dia 17.
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Por coincidência, em agosto o Conselho Internacional de Museus aprovou uma nova definição de museu, acrescentando-lhe conceitos como acessibilidade e inclusão. Mas já antes disso a Câmara de Gaia planeava criar um calendário de visitas orientadas naqueles que são os espaços culturais mais procurados, entre os que têm gestão municipal. Depois de algumas tentativas falhadas por falta de inscritos, a iniciativa pôde por fim avançar.
Fundamental aqui é a parceria com a Associação de Surdos do Porto, que disponibiliza uma pessoa para fazer a tradução. O JN acompanhou o primeiro grupo que foi à Casa-Museu Teixeira Lopes, onde os conhecimentos sobre a obra do artista se misturaram com histórias contadas por algumas participantes, que viram as suas memórias avivadas pelas esculturas.
Aconteceu, por exemplo, junto de "Flora", estátua que é uma homenagem às flores e à primavera, esculpida em forma de mulher trabalhadora e robusta, mas bonita, como foi dito entre os presentes. Ao vê-la, não faltou quem recordasse os seus tempos dedicados à agricultura.
Ali na versão original, em gesso, como a maior parte dos trabalhos de Teixeira Lopes, "Flora" está reproduzida em bronze no Jardim da Cordoaria, no Porto. A cidade também exibe a réplica do busto de Baco, na Praça da República.
Os visitantes ficaram também a saber pormenores sobre a rainha Santa Isabel e o "milagre das rosas". E que Teixeira Lopes prestou homenagem a várias personalidades da cultura portuguesa, como Alfredo Keil, compositor do hino nacional, "A Portuguesa", o multifacetado artista Rafael Bordalo Pinheiro, de quem era amigo, o historiador Oliveira Martins ou o escritor Almeida Garrett.
Além do local que funcionava como oficina, os visitantes puderam ver a parte residencial do edifício e as coleções e objetos pessoais que António Teixeira Lopes (1866-1942) deixou cuidadosamente expostos. Entre eles, as pinturas, os leques, as rendas feitas pela mãe, as estatuetas a representar elementos do presépio, a escrivaninha que levou para Paris e muitas outras preciosidades, como um tinteiro de Garrett.
"Eles estão felizes", disse a coordenadora do museu no final da visita. Vera Oliveira referiu ao JN que se tratou de "uma experiência muito gratificante, porque permitiu a pessoas com algumas dificuldades ter acesso à cultura de uma forma leve e muito divertida". E foi mais longe: "Esta visita foi muito mais interativa e dinâmica do que outras, com visitantes ouvintes".
A responsável disse ainda que a Câmara de Gaia está a ponderar organizar visitas orientadas também para cegos. Talvez já seja possível em 2023, no Dia Internacional dos Museus, celebrado a 18 de maio.
Coube a Vânia Ferreira a tarefa de traduzir as explicações que a coordenadora ia dando a cada passo. Já com experiência no meio cultural, encontrou neste grupo "pessoas muito curiosas".
Quanto às dificuldades com que costuma deparar-se, referiu-nos que tudo depende do público que tem à frente: "Se forem pessoas que dominem bem a língua gestual, facilmente compreendem as datas e os períodos históricos. Se não, tenho de adaptar a comunicação".
"Foi muito engraçado por ser um grupo de pessoas mais velhas, que se identificaram muito com a história do convento e, aqui, recordaram vivências da agricultura", concluiu.
As inscrições fazem-se através do endereço de email gaiacultura@cm-gaia.pt.