Grupos foram convidados a integrar restaurantes solidários ou a intervir noutras zonas do Porto. Estratégia não é consensual entre quem ajuda.
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A Câmara do Porto quer acabar com a distribuição de comida a sem-abrigo e a carenciados nas ruas da Baixa. Lembra que com a abertura do terceiro restaurante solidário, no Beco de Passos Manuel, garantiu-se uma resposta "digna" para quem precisa. Nesse contexto, juntamente com a coordenação do NPISA Porto - Núcleo de Planeamento e Intervenção para Pessoas em Situação de Sem-Abrigo, reuniu-se com as associações que distribuem comida e querem continuar com esse apoio, sugerindo a colaboração com o restaurante solidário ou, em alternativa, a servir zonas atualmente a descoberto. No entanto, há associações que discordam da estratégia, até porque continuam a ajudar muitas pessoas, mesmo com os restaurantes solidários a trabalhar.
Foi há 15 dias que a associação Amigos Improváveis - que na quinta-feira assinala um ano de atividade -, recebeu o "ultimato" de que tinha de deixar a zona da Batalha, em frente à igreja de Santo Ildefonso, contou ao JN Isabel Cristina, um dos elementos da equipa de 31 voluntários. "Iremos continuar a estar presentes na Batalha, como sempre estivemos ao longo do nosso ano de existência, independentemente da opinião do Executivo municipal, o espaço público é de todos, até mesmo dos mais desfavorecidos", garantiu Isabel Cristina, dando conta que todas as quintas-feiras distribuem 80 cestas básicas e 120 refeições quentes. Além disso, acrescenta, o trabalho da associação vai "muito para além do simples fornecimento de comida", sublinhando que já várias vezes "acompanharam pessoas ao médico".
Associações contactadas
Ao que o JN apurou, foram cerca de uma dúzia as associações que foram contactadas para deixar de fornecer comida nas ruas do centro da cidade. Há grupos que aceitaram integrar os restaurantes solidários. E outros, como a Legião da Boa Vontade, que continuam a fornecer comida noutras zonas (Amial e Antas).
Ana Paula Paiva, do grupo Amor Perfeito, que desde 2012 presta apoio aos sem-abrigo e a famílias carenciadas, contou que foram "convidados" a sair do quarto andar do parque de estacionamento da Trindade. Um local cedido pela Câmara e onde distribuíam comida e kits com outros bens alimentares, todas as quintas-feiras, há quase cinco anos. Tanto ao Amor Perfeito como aos Amigos Improváveis foi sugerido que passassem a intervir noutras zonas da cidade, "fora do centro, como a Pasteleira ou junto ao S. João", dizem as voluntárias. "No fundo, há uma intenção de limpar a cidade e mostrar que aqui só há coisas bonitas", ironizou Ana Paula.
A Câmara frisou que os restaurantes solidários pretendem substituir a distribuição de comida no espaço público criando-se condições para prestar um apoio com mais dignidade, prevendo a abertura de um outro na zona ocidental. E que estas medidas já estiveram para ser implementadas em dezembro, mas a quadra natalícia e a vaga de frio determinaram o adiamento para este mês.
Cidade tem três restaurantes solidários
Servidas 525 refeições por dia
O Município do Porto tem em funcionamento três restaurantes solidários, onde são servidas, em média, 525 refeições por dia. A cidade tem atualmente cerca de 190 pessoas em condição de sem-abrigo sem teto.
Investimento de 300 mil euros
O investimento totaliza cerca de 300 mil euros por ano e corresponde a um trabalho articulado em rede com várias organizações da cidade.
Balanço de refeições servidas em 2020
Só no ano de 2020, foram servidas cerca de 150 mil refeições nos três espaços.
Primeiro restaurante abriu na Batalha
O primeiro restaurante solidário abriu portas em 2017, na Batalha, em instalações alugadas ao Hospital do Terço.
Segunda unidade no Joaquim Urbano
Inserido na Estratégia Municipal para a Integração de Pessoas em Situação de Sem-Abrigo, mas que é extensível a todos os munícipes em situação de vulnerabilidade, abriu em 2019, a segunda unidade nas instalações do antigo Hospital Joaquim Urbano, onde funciona o Centro de Acolhimento Temporário.
Associações de voluntários ajudam
A confeção das refeições foi centralizada no restaurante solidário do Joaquim Urbano, assegurada pelos Serviços de Assistência Organizações de Maria. É a partir daqui que chegam as refeições aos outros restaurantes, com apoio de voluntários.