Madalena Sá Fernandes denuncia "misoginia e machismo" após comentários de crítico literário à sua aparência
Madalena Sá Fernandes respondeu às críticas de João Pedro George sobre a sua imagem, após este ter descredibilizado a sua obra, "Leme", com base na aparência. O crítico lamentou as observações que fez durante o programa, descritas pela autora como "misóginas".
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Madalena Sá Fernandes, cronista do jornal "Público" e autora do livro "Leme", recorreu às redes sociais para partilhar um excerto de um episódio do videocast "Quinteto Literário", onde o crítico literário João Pedro George fez uma análise ao seu best-seller com base na aparência física e em publicações nas redes sociais.
A obra "Leme" conta a história de uma relação abusiva, mas, para João Pedro George, a postura de Madalena revela "frieza" acerca do tema. "Comecei a ver o Instagram dela e depois a imagem não combinava com o tema. Não estava à espera de encontrar uma pessoa seminua deitada numa banheira com o livro na mão", disse o sociólogo, acerca de uma fotografia onde a escritora promovia o novo livro, "Deriva".
"Ouçam porque vão aprender que há um rosto para a violência doméstica. É só mais um homem triste incomodado porque eu sorrio. Porque tenho fotografias de calções ou de macacão com flores. Um homem triste", rebateu Madalena Sá Fernandes, que viu o seu trabalho ser descredibilizado pelo crítico.
"Nunca rebateria uma crítica literária. Mas aqui inaugura-se a crítica às fotografias de Instagram, à vida pessoal, e a extraordinária crítica ao sorriso de quem sofreu. A analisar o meu corpo e a pedir pareceres. E depois perguntam porque é que as mulheres insistem em escrever sobre o que vivem. É porque ainda há muito caminho. É porque ainda há pessoas como vocês. A objetificação costuma ser menos gritante", acrescentou.
A escritora deixou também uma crítica aos escritores Miguel Szymanski e Ana Bárbara que, assim como João Pedro George, também fizeram parte do episódio, apesar de não participarem nos comentários classificados como misóginos por Sá Fernandes. "Aqui temos misoginia e machismo sem a menor vergonha. Homens tristes e mulheres que compactuam. Ganhem vergonha".
"Continuarei a escrever sobre o que eu quiser. E não abdico do meu sorriso. Não abdiquei por todas as violências que sofri; não vou abdicar por homens tristes, solitários, invejosos. Empenho-me muito no meu trabalho, mas sou mulher", concluiu.
Figuras públicas apoiam escritora
A publicação de Madalena Sá Fernandes contou com milhares de comentários, incluindo de diversas personalidades conhecidas, como cantoras ou atrizes.
A rapper Capicua foi uma das primeiras a manifestar desagrado com o que foi dito por João Pedro George: "Fez bingo no cartão de macho ultrapassado. Duvidar do mérito sempre, dizer que deve ser cunha, pedir o recato e a cabeça baixa das vítimas, tudo para nao ter de lidar com o talento de uma mulher bem sucedida".
Também a atriz Inês Castel-Branco reagiu às polémicas declarações: "Que ramalhete. Só faltou dizer que estavas a pedi-las. Uma mulher com talento quando é bonita continua a incomodar muita gente. Que pena que eu não estava lá com eles".
Crítico defende-se
João Pedro George já se pronunicou sobre o tema. "Estou ciente de que referir a aparência de uma mulher tem um longo historial na cultura patriarcal e machista e que convocar esse elemento numa conversa pública é errado e infeliz", referiu, na caixa de comentários da publicação.
"Peço assim desculpa por tal associação de ideias, porém, não era essa a minha intenção. Em nenhum momento pretendi estabelecer uma correlação entre a qualidade da obra e a sua promoção nas redes sociais. A minha abordagem tem visado quase sempre a literatura como fenómeno social e como fonte de análises sociológicas. Nesse sentido, avaliar a semiótica de autores e autoras – sem distinção de género –, no âmbito do meio editorial, é um exercício que venho praticando, de forma descontraída e caricatural", continuou.
Para terminar, o sociólogo lamentou qualquer "desconforto" que a sua "liberdade crítica, por vezes sarcástica", possa ter criado à autora.