Uma nova edição, um novo conceito, com o Portugal Fashion a arrancar com força no Douro Vinhateiro, apostando numa plataforma que alia moda, inovação e cultura. Primeiro dia foi marcado pelo desfile da Marques’Almeida, a apresentação de Maria Gambina e pela voz de Carminho, enquanto musa de Maria Carlos Baptista.
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Sob um sol abrasador, com temperaturas a atingirem os 37 graus, arrancou ontem o Portugal Fashion numa nova edição que teve lugar no Douro Vinhateiro. Assente no mote da resiliência, este evento, que comemora o seu 30.º aniversário após um interregno de quase dois anos, deu início às suas actividades na emblemática Quinta do Bomfim, no Pinhão, com a energia e determinação dos criadores nacionais voltados para o futuro da moda portuguesa.
Com o rio Douro a enquadrar o cenário e os socalcos a emoldurar a paisagem, Marta Marques e Paulo Almeida apresentaram um desfile único no alpendre da Casa dos Ecos. A coleção outono/inverno 2025 refletiu a intensidade do quotidiano dos criadores, celebrando a diversidade de identidades da marca, numa simbiose perfeita com o ambiente natural, incluindo detalhes como o feno nos pés das modelos, que conferiu uma atitude grunge à elegância característica da Marques’Almeida.
Marta Marques explicou que a coleção apresentada combina as linhas pre-fall — já disponíveis nas lojas — e autumn/winter, que será lançada no próximo mês. “Produzimos quatro coleções por ano: pre-fall, outono/inverno, resort e primavera/verão, totalizando oito showrooms anuais”, esclareceu. “A marca tem vindo a evoluir não só por uma dinâmica natural, mas também em resposta à transformação do mercado, que se tornou mais conservador devido à instabilidade global. Adaptarmo-nos é fundamental para a nossa sobrevivência; sem essa capacidade não estaríamos aqui 15 anos depois.”
O desfile no Douro refletiu essa dualidade, com peças elegantes a serem combinadas de forma inesperada, como vestidos em tafetá e mikado acompanhados por boyfriend jeans, evidenciando uma liberdade estilística que foge à rigidez habitual dos desfiles, valorizando a ideia de um grupo de amigas com uma atitude descontraída e contemporânea.
Quanto à escolha do Douro Vinhateiro, Marta Marques revelou tratar-se de um projecto antigo, desenvolvido em parceria com Mónica Neto, diretora do Portugal Fashion. “Temos a sorte de contar com uma equipa excecional que abraça estes desafios. Este regresso é também um reencontro com a produção local, que sempre valorizámos.”
A coleção destacou-se pela presença marcante de tecidos nobres, como o fil coupé, tafetá de seda e brocados florais, que reforçam o equilíbrio entre a elegância e a irreverência característica da Marques’Almeida. Marta abordou ainda as dificuldades do contexto internacional, com a perda de mercados tradicionais no Líbano, Rússia e Ucrânia, consequência da instabilidade económica e social, e a aposta renovada no mercado norte-americano, onde a marca tem registado um aumento significativo nas vendas, sobretudo nas linhas de festa e noite, sem abdicar da sua identidade casual.
A produção da Marques’Almeida mantém-se inteiramente em Portugal, nas fábricas têxteis do Norte, um compromisso firme com a qualidade e com o trabalho local. Marta destacou que trabalhar com o Portugal Fashion tem sido “uma das experiências mais gratificantes” e realçou a abertura do evento para desafiar a forma tradicional de organizar desfiles, transformando-os em experiências que contam a história da marca.
A ligação à natureza e a fusão entre moda e música
Antes do desfile, assistiu-se à apresentação da coleção verão 2025 da designer Maria Gambina, num cenário singular: a cave de armazenamento do vinho do Porto na Quinta do Bomfim. As imagens da sessão fotográfica, realizadas nas vinhas durante a manhã, foram projetadas nas paredes, criando uma atmosfera envolvente acompanhada por música lounge e coquetéis. Gambina explicou que optou por não apresentar uma coleção tradicional de inverno, preferindo divulgar a sua proposta por meio das redes sociais, em sintonia com a sua visão mais fluida da moda.
O primeiro dia, em Alijó, encerrou com uma conversa entre a jovem designer Maria Carlos Baptista e a fadista Carminho. A cumplicidade entre ambas é evidente, fruto de anos de colaboração, durante os quais Baptista tem criado as indumentárias usadas pela artista nos concertos, atuações e eventos da artista. “Visto Maria porque acredito nela e na nossa ligação, sinto-me poderosa e consigo expressar-me”, afirmou Carminho. “Sinto-me no palco quando ela usa as minhas peças”, completou Baptista. A sessão foi acompanhada por duas interpretações de fado, encerrando o primeiro dia do Portugal Fashion com uma forte ligação entre moda e cultura portuguesa.
Este regresso do Portugal Fashion acontece depois de quase dois anos de interrupção, devido à extinção dos fundos comunitários do Portugal 2020 em outubro de 2022. Com o apoio do Portugal 2030 e sob a direção de Mónica Neto, o evento assume uma nova dimensão — Portugal Fashion Experience — tornando-se uma plataforma que integra ativação territorial, inovação empresarial e reposicionamento internacional da moda portuguesa, com iniciativas que se estendem pelo Porto, Matosinhos, Gondomar e Famalicão.
O Portugal Fashion prossegue até sábado, prometendo mais desfiles, apresentações e momentos que vão além da moda, reforçando a relevância da indústria têxtil e a capacidade da moda portuguesa para se reinventar e afirmar no mercado global.