O presidente da Comissão Nacional Justiça e Paz considerou esta sexta-feira "completamente vergonhoso" o Governo estar a preparar a reforma do Estado com técnicos do Fundo Monetário Internacional, defendendo que é um assunto que deve ser discutido na "praça pública".
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Uma fonte do Governo citada pela agência Lusa disse que "estão a ser realizadas reuniões com os ministérios para análise das principais áreas de despesa e para perceção do que pode ser feito em matéria de reformas".
Citando um comentador que observava o facto de serem técnicos do FMI a ajudarem o Governo a pensar e a delinear as linhas sobre as funções do Estado, o presidente da Comissão Nacional Justiça e Paz (CNJP) considerou ser "uma coisa completamente vergonhosa".
"Isto não é um problema para os técnicos do FMI resolverem, isto é um problema para ser discutido na praça pública e para suscitar opções de natureza política claras", disse Alfredo Bruto da Costa, que falava à Lusa a propósito da conferência anual da CNJP "Portugal: O país que queremos ser", que se realiza no sábado na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.
O antigo presidente do PSD e atual conselheiro de Estado Luís Marques Mendes disse, num programa televisivo, que as alterações na reforma do Estado podem passar por mais concessões a privados, nomeadamente nos centros de saúde e nos transportes públicos, pelo aprofundamento da mobilidade especial na função pública e por um aumento dos copagamentos dos cidadãos na Saúde e na Educação.
Para Bruto da Costa, são questões "extremamente" delicadas que alguns países vêm a discutir desde o início dos anos 80.
Lembrou que "foi uma onda muito forte que afetou alguns países da Europa central, que depois passou": "Agora está a afetar sobretudo os países que, por razões que conhecemos, estão muito fortemente tentados e inclinados a adotar medidas de caráter neoliberal", que seguem uma "linha muito individualista de que, cada um, resolva os seus problemas e o Estado faça o menos possível".
Um dos temas que a conferência vai debater é "O papel do Estado na realização do bem comum": "Na atual conjuntura estou muito preocupado com a forma como o problema é posto. O problema do papel do Estado é uma questão, antes de mais, de filosofia política e de opções políticas".
"Estamos a olhar para o problema do papel do Estado através da necessidade de cortes orçamentais. Portanto, o próprio objetivo com que estamos a olhar para o problema já é uma forma perversa de tentarmos ter ideias claras sobre o assunto", disse.
Para Bruto da Costa, é necessário ter uma noção clara do que é um bem comum numa sociedade, não apenas numa conjuntura estrutural. "Só a partir daí é que nós podemos ver as implicações financeiras e qual é a possibilidade de a sociedade se dispor ou não a financiar isso".
"Agora começar a reforma do Estado com um objetivo de cortar uma despesa, parece-me uma perspetiva perversa logo à partida", reiterou.
Sobre o tema da conferência "O país que queremos ser", o economista explicou que não está relacionado com acontecimentos conjunturais, uma vez que já tinha sido escolhido no início do ano.
Contudo, "já era claro que, além das medidas conjunturais que eram precisas, o país também precisava de uma reflexão profunda sobre aspetos mais duradouros, mais estruturais sobre o próprio tipo da sociedade que os portugueses querem".