Cavaco Silva lembra alertas feitos "na altura certa", quando havia tempo para mudar de rumo
O Presidente da República lembra, num texto divulgado hoje, os alertas que foi fazendo sobre a situação do país, insistindo que foram feitos "na altura certa", quando havia tempo para mudar de rumo.
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Logo na parte inicial do prefácio do livro "Roteiros VI", divulgado esta noite do 'site' da Presidência da República, o chefe de Estado faz questão de recordar todos os alertas que deixou sobre a situação de emergência económica, financeira e social para que o país caminhava.
"Não tinha sido por falta de alertas, feitos em público e em privado, que o Governo [de José Sócrates] não tinha ajustado as suas políticas, de modo a conter o agravamento da situação económica e social", refere, lembrando várias intervenções que foi fazendo, nomeadamente o discurso de Ano Novo de 2010, onde falou em "situação explosiva" ou a expressão "situação insustentável" utilizada no 10 de Junho do mesmo ano.
Alertas que, sublinha, são a melhor prova de que falou "na altura certa, quando ainda havia tempo para corrigir políticas e para mudar de rumo".
"Porque penso na situação que agora vivem milhares de portugueses, não me congratulo pelo facto de a História me ter dado razão. Lamento, isso sim, que perante uma evidência tão objetiva e tão clara, interesses de ocasião, aliados a forma obstinada de ação política, tenham contribuído para que a palavra serena, firme e imparcial do Presidente da República haja sido menosprezada, quando deveria ter merecido a reflexão séria por parte dos responsáveis políticos", afirma Cavaco Silva.
A constatação de que os seus alertas não eram ouvidos foi o que levou à proposta de uma "magistratura ativa", explica Cavaco Silva, sublinhando que se trata de uma noção que "não colide nem infirma o princípio de cooperação estratégica".
Ainda a propósito dos alertas que foi deixando, o chefe de Estado lembra que os problemas da economia portuguesa identificados pela 'troika' "coincidiram, na essência, com aqueles para que, em devido tempo, tinha alertado".
Sobre o programa de ajustamento financeiro, o chefe de Estado recorda também o apoio dado ao Governo para que não deixassem de ser adotadas as medidas necessárias e os contactos com os partidos da oposição para "sensibilizá-los para uma atitude de cooperação responsável".
"O facto de, após a demissão do primeiro-ministro, se ter começado a viver um ambiente de pré-campanha eleitoral, certamente contribuiu para o atraso no pedido de auxílio financeiro", acrescenta, lamentando que na altura a questão se tenha convertido num tema de controvérsia político-partidária, quando, pela sua gravidade, deveria ter sido tratada numa perspetiva de "salvaguarda do interesse nacional, que não conhece partidos nem fações".
No texto, o Presidente da República reitera ainda que quando convocou as eleições legislativas antecipadas de 2011 se guiou "exclusivamente" pelo "superior interesse nacional", não permitindo qualquer "partidarização" ou "instrumentalização", e tenta clarificar a "ilusão" de que o Presidente da República pode impor aos partidos, contra a vontade destes, a sua participação em governos de "salvação nacional".
O Presidente da República, refere, pode exercer a sua magistratura de influência para que sejam encontradas soluções de Governo estáveis e coerentes, mas não deve levar um partido a aceitar "a contragosto" coligar-se com outro, pois daí resultaria uma solução "artificial e precária", que se consumiria em lutas internas, dando lugar a "uma instabilidade política muito prejudicial ao país".
No texto, onde Cavaco Silva recua até outubro de 2009, omitindo apenas o período da campanha eleitoral para as presidenciais de janeiro de 2011 porque "este ainda não é o momento de escrever" sobre ela, dedica ainda um 'capítulo' ao que chama de "uma estatística esclarecedora".
Nesse 'capítulo' faz a contabilidade dos diplomas que recebeu do Governo para promulgação no primeiro mandato em Belém: 1741 diplomas, dos quais 696, ou seja, 40 por cento, deram lugar a contactos entre a Presidência da República e o Governo.
Daí, conta Cavaco silva, resultaram alterações em 381, ou seja, 22 por cento do total dos diplomas submetidos a promulgação.
"Trata-se de uma importante dimensão da magistratura de influência do Presidente da República, tanto mais eficaz quanto exercida discretamente, fora do alcance dos holofotes da comunicação social", nota.