Especialista Pinto de Albuquerque defende que escutas só devem ser destruídas no fim do inquérito.
As escutas são propícias a grandes diferendos e o aspecto particular da sua destruição é dos mais sensíveis, havendo quem defenda que mesmo as irrelevantes só podem ser destruídas no fim das investigações. Consensual parece ser a possibilidade de o Ministério Público (MP) recorrer da decisão de Noronha Nascimento.
O artigo 188º do Código de Processo Penal (CPP) diz que a "destruição imediata" das escutas pode ser decidida por um juiz em três situações: quando elas respeitarem a conversas em que não intervenham arguidos ou suspeitos de crimes com pena superior a três anos, intermediários ou vítimas; quando abranjam matérias sob segredo (profissional, de funcionário ou de Estado); ou quando a sua divulgação afectar gravemente direitos, liberdades e garantias.
O especialista Paulo Pinto de Albuquerque parece fazer uma leitura do edifício jurídico mais restritiva. "Se o juiz entender que não se mantêm os pressupostos de validade da escuta, ele não pode ordenar a destruição imediata dos relatórios e dos suportes técnicos relativos a conversações manifestamente estranhas ao objecto do processo", defende, na obra "Comentário do Código de Processo Penal". Em sua opinião, as escutas só podem ser destruídas depois de concluído o inquérito criminal.
Este professor avoca duas razões para aquela tese. Primeiro, trata-se de defender o direito constitucional do arguido de, "findo o período de segredo interno, conhecer a totalidade das escutas telefónicas realizadas no processo". Só assim, justifica, ele pode contrariar a interpretação feita pelo MP.
Por outro lado, "só no final do inquérito é que o MP pode ter uma visão completa da prova que lhe permita concluir se uma escuta realizada interessa ou não à prova", sustenta Albuquerque, também defensor da tese de que o poder de validar as escutas com José Sócrates pertencia ao juiz de instrução de Aveiro. Ordenada a destruição destas escutas por Noronha Nascimento, resta saber se essa decisão afecta também os originais do inquérito Face Oculta.
Seja como for, o presidente do Sindicato do Ministério Público já veio sublinhar que o despacho de Noronha é recorrível, para o Tribunal Constitucional. O artigo 399º do CPP diz que "é permitido recorrer dos acórdãos, das sentenças e dos despachos cuja irrecorribilidade não estiver prevista na lei."
