
Sócrates foi muito crítico com Cavaco Silva
Orlando Almeida/Global Imagens
José Sócrates regressou para "tomar a palavra" e acusar o presidente da República de ter parcialidade e de "não ter autoridade moral para o acusar de deslealdade". Mas garante que não quer cargos futuros.
A entrevista foi longa (mais de 90 minutos) e Sócrates aproveitou-a muito bem para explanar a sua versão dos factos que levaram à sua demissão"e ao pedido de ajuda externa. Fê-lo com um ataque cerrado a Cavaco Silva, acusando-o de "sempre usar dois pesos e duas medidas ao tratar este Governo e o anterior". E mostrou que não perdoa ao presidente da República ter-lhe feito "um ataque pessoal, por escrito, um ano depois de ter saído do Governo", quando o chefe de Estado o acusou de deslealdade.
"Não reconheço nenhuma autoridade moral para me acusar de deslealdade", afirmou o antigo primeiro-ministro, acusando o chefe de Estado de ter sido "o patrono da atual solução política" e de não ter evitado a queda do seu Governo. Pelo contrário, afirmou, "com o discurso de posse do segundo mandato, esteve na origem da crise política de 2011".
O político José Sócrates, que chegou à RTP mais de duas horas antes da entrevista, acompanhado do seu ex-chefe de gabinete e atual deputado André Figueiredo, transmitiu a mesma imagem que o caraterizou nos últimos anos da sua governação. Com sinais da arrogância que o caracterizava no relacionamento com os jornalistas e revelando convicção, o homem que esteve seis anos à frente dos destinos do país apenas assumiu um erro, o de ter formado um Governo minoritário em 2009. Quanto ao resto, foi perentório a repisar a teoria de que a responsabilidade de pedir ajuda externa foi da Oposição, "que chumbou o PEC4".
Munido de alguns papéis com apontamentos, o antigo primeiro-ministro insistiu que voltou para "tomar a palavra" com o objetivo de se opor à "narrativa da Direita", que o acusa "de ter sido a origem de todos os males que o país atravessa". Isto porque, sublinhou por mais do que uma vez, "essa narrativa não tem sido contraditada". Um laivo de crítica à liderança de António José Seguro, que a seguir neutralizou, ao dizer "ser normal que um novo líder queira falar para o futuro e não para o passado".
"Quem tem de defender a minha governação sou eu", acabou por afirmar ainda no início da entrevista.
Sempre defendendo que teria sido possível evitar a intervenção da troika, Sócrates foi enumerando o que disse serem os "embustes" da tal narrativa da Direita, o "despesismo" de que é acusado ou de que a austeridade depende do memorando da troika assinado por si.
Largando o passado, Sócrates garante que não tem planos para o futuro político e foi muito duro a atacar a atual situação política, de "não puxar pelas energias do país ", pelo contrário, de "matar todas as expectativas dos portugueses". E citou Dante na Divina Comédia para acentuar que "não se pode governar sem dar uma esperança": "Vós que entrais (no Inferno) abandonai toda a esperança."
