O Tribunal Constitucional considerou que não existem ambiguidades ou obscuridades na decisão relativa ao Orçamento do Estado para 2014 e decidiu que não lhe cabe esclarecer as "dúvidas de ordem prática" suscitadas pela Assembleia da República, a pedido do Governo.
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"Os esclarecimentos que o requerente pretende obter não derivam de qualquer vício ou deficiência que seja imputável ao acórdão, mas resultam de dúvidas de ordem prática que respeitam ao cumprimento do julgado", lê-se no acórdão 468/2014, publicado, esta quarta-feira, na página do TC.
Nas conclusões, o TC assinalou que "não cabe ao Tribunal Constitucional esclarecer outros órgãos de soberania sobre os termos em que estes devem exercer as suas competências no plano administrativo ou legislativo".
No dia 3 de junho, o primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, escreveu à presidente da Assembleia da República, Assunção Esteves, a pedir que requeresse ao TC a "clarificação técnica de algumas partes do acórdão", nomeadamente sobre os efeitos no pagamento dos subsídios e se a decisão se aplica a partir de 30 ou 31 de maio.
O envio do pedido pela Assembleia da República foi aprovado em conferência de líderes no dia seguinte, apenas com os votos da maioria, e sexta-feira, dia 6, em plenário, PSD e CDS-PP rejeitaram os recursos da oposição contra este procedimento.
Quanto à primeira questão suscitada, a data a partir da qual se aplicariam os efeitos da inconstitucionalidade dos cortes nos vencimentos dos funcionários públicos, o TC considerou que "não enferma de qualquer obscuridade ou ambiguidade".
O TC explicou ainda assim que a opção pela restrição de efeitos à data da decisão, 30 de maio, significa por um lado que a sentença não tem efeitos retroativos e, por outro, que os efeitos se produzem a partir do dia imediato, 31 de maio, pela aplicação de um princípio geral de Direito que o Tribunal entendeu "não ser necessário explicitar".
"Datando o acórdão de 30 de maio de 2014, os efeitos da declaração de inconstitucionalidade produzem-se a partir do dia imediato, por aplicação de um princípio geral de direito - que se entendeu não ser necessário explicitar - segundo o qual no cômputo do termo não se conta o dia em que ocorre o evento a partir do qual ele deve iniciar-se", refere o documento.
Assim, o TC entendeu que os esclarecimentos requeridos "não derivam de qualquer obscuridade ou ambiguidade que o acórdão contenha quanto à limitação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade" mas sim com "aspetos de ordem prática que respeitam já ao cumprimento do julgado e extravasam o âmbito da atividade jurisdicional do Tribunal".
Por essa razão, apesar de ter considerado admissível o requerimento entregue pela AR a pedido do Governo, o Tribunal Constitucional assinalou que "a pretexto do princípio da cooperação institucional, não é possível instruir o órgão legislativo ou executivo" sobre os termos em que deverá cumprir a decisão.
Os juízes argumentam que o TC "não poderia explicitar" em que termos é que a restrição de efeitos poderá afetar o pagamento do subsídio de Natal ou de subsídio de férias por isso ser já matéria do cumprimento da decisão de inconstitucionalidade.
Neste ponto, o acórdão assinala até que aquela matéria "é solucionável por recurso ao ordenamento jurídico em vigor ou, caso se entenda necessário, por via de concretização legislativa".
Assinado pelos 13 juízes conselheiros, o acórdão sublinha que que o Tribunal Constitucional, enquanto órgão de fiscalização da constitucionalidade, não pode intervir no âmbito da competência administrativa do Governo" ou "invadir a esfera do legislador ordinário".
"E esse princípio é aplicável tanto em relação a uma decisão de inconstitucionalidade como em relação a uma decisão de limitação de efeitos, quando a modulação dos efeitos produzidos pela declaração de inconstitucionalidade esteja dependente de uma ulterior intervenção legislativa", acrescenta.