Um quadro da pintora Vieira da Silva, de 80 mil euros, foi adquirido para o gabinete do ex-presidente do Supremo Tribunal de Justiça Aragão e Seia explicou esta terça-feira Ricardo Cunha, que está a ser julgado por desvio de dinheiros públicos
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A declaração foi feita pelo ex-administrador do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) que começou esta terça-feira a ser julgado, nas varas criminais de Lisboa, pelo desvio de dinheiros públicos daquela instituição, entre outros crimes.
O quadro da famosa pintora portuguesa foi comprado contra uma factura de apenas 40 mil euros, sendo o restante pago através de outras rubricas do orçamento do STJ, explicou o arguido.
"Ele [Aragão e Seia falecido em 29 de Janeiro de 2006] queria que se fizessem aquisições para dignificar o aspeto do Supremo Tribunal de Justiça", afirmou Ricardo Cunha, principal acusado num processo que tem mais 11 arguidos.
Ricardo Cunha, que admitiu na sessão da manhã desta terça-feira ter-se "apropriado" de uma pintura de José de Guimarães no valor de 8.890 euros e outra de Noronha da Costa, de 3.000 euros, disse que a compra de obras de arte era um objectivo do ex-presidente, quarta figura de Estado, para melhorar a imagem do tribunal.
"Antes de Aragão e Seia assumir a presidência do Supremo Tribunal de Justiça, os cortinados pareciam bacalhaus secos e os sofás estavam rotos e ouviam-se as molas quando as pessoas se sentavam", exemplificou o arguido.
Além disso, acrescentou, aquele juíz conselheiro "não podia ter uma lâmpada fundida nem uma parede vazia [sem um quadro]".
O Ministério Público acusou Ricardo Cunha de desvio de dinheiros públicos (peculato) e falsificação e exige uma indemnização superior a 300 mil euros.
O arguido contou em tribunal que chegou a acumular as funções de administrador do STJ com as de chefe de gabinete de Aragão e Seia, cargos que manteve quando a presidência do Supremo foi assumida pelo juíz conselheiro Nunes da Cruz.
Outro dos aspectos debatidos durante a primeira sessão do julgamento foi a aquisição de prendas para oferecer às personalidades que visitavam o STJ.
"Havia stocks gigantescos" de loiças e cristais Vista Alegre e Atlantis para essas ocasiões, e "nunca houve inventário dessas peças", afirmou Ricardo Cunha.
Ao arguido foram apreendidas em buscas domiciliárias entre outros objectos de luxo e obras de arte, fotografias de Lagoa Henriques, uma gravura de Paula Rego, um quadro de Lionel Moura, uma escultura de João Cutileiro e um colar de ouro.