Oliveira Pereira tem nas mãos a delicada reestruturação da PSP e o desafio de fazer baixar os níveis de criminalidade. Nesta entrevista ao JN, o director nacional da PSP afirma que existem demasiados sindicatos de polícias e sugere uma redução dos actuais nove para "dois ou três". Oliveira Pereira considera ainda que aumentou o número de armas ilegais a circular no nosso país.
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Há 20 anos dava-se o episódio dos "Secos e Molhados". Que comparação faz entre a PSP dessa altura e da actualidade?
Há uma diferença abissal sob todos aspectos, desde o operacional, a orgânica, a própria missão, as ameaças... Do ponto de vista interno também há uma diferença substancial, pela existência dos sindicatos. A polícia é muito diferente do que era há 20 anos.
Como é hoje a relação entre os sindicatos e o comando, tanto mais que o Governo e os sindicatos estão a discutir os estatutos?
Passámos por uma fase complicada. O número de sindicatos é um número que na minha opinião ultrapassa as necessidades, há um número excessivo de sindicatos. No entanto, o relacionamento neste momento entre os sindicatos e a hierarquia da polícia, mais concretamente com a Direcção Nacional, é excelente. Há lealdade, há uma troca de informação permanente, eles fazem o papel deles, têm que o fazer, lutar pelos direitos dos seus associados. Eu fui sindicalizado até à minha tomada de posse como director nacional da PSP. Não só aceito os sindicatos como reconheço a sua existência e utilidade.
Mas as acções de rua são frequentes, os protestos, e isso não poderá pôr em causa a imagem da polícia?
Vivemos num regime democrático, portanto, temos que aceitar as regras desse mesmo regime. As regras passam por isso: se é permitido que as pessoas se manifestem, elas manifestam-se quando sentem que não estão a ser correspondidas nos anseios e naquilo que pretendem.
Então os polícias manifestam-se porque se sentem descontentes.
Acredito que sim.
Há actualmente nove sindicatos na PSP, como lida com esse número?
Esse número desagrega um pouco o tecido policial, porque são muitas pessoas, tem a ver com a operacionalidade da polícia por razões que mexem com o gozo de licenças, o gozo de créditos, tudo isto tem implicação no próprio serviço. Quando há uma esquadra que tem sessenta homens e em que dez são sindicalizados e que têm direito aos créditos, naturalmente que isto vai ter implicações do ponto de vista operacional.
Mas isso acontece?
Não sei se agora acontece, mas sei que aconteceu e não foi há muito tempo.
E qual a solução?
Os sindicatos deveriam ser proporcionais ao número de aderentes, até dois ou três sindicatos era mais do que o suficiente.
E quer reduzir esse número?
É um problema essencialmente político, a Lei Sindical é uma lei da Assembleia da República, portanto nem me pronuncio sobre isso. Agora não deixo é de ter uma opinião.
Já manifestou a sua opinião ao ministro da Administração Interna?
Sim.
A ASPP recebeu um parecer do Ministério das Finanças a concordar com o pagamento das horas extraordinárias na PSP. Já tomou posição?
Não tomei nem tomo, porque o documento é um parecer, que me foi enviado para conhecimento, tem implicações profundas na estrutura, não apenas financeiras, portanto, aguardo. Se a ideia for nesse sentido, eu tenho que receber orientações da tutela.
Mas tem alguma posição?
Tenho algumas dúvidas quanto à capacidade de implementação das horas extraordinárias, pelo menos este ano, no orçamento da PSP não está prevista essa despesa.
Nem conversou sobre a questão com o ministro Rui Pereira?
Tive uma simples conversa, mas não conclusiva.
Face ao acréscimo da criminalidade registado o ano passado, como é que estão os dados para este ano?
Ainda não tenho os dados, mas tenho esperança de que haja um decréscimo ligeiro da criminalidade. No entanto, não se esqueça de que em Março do ano passado nós recebemos a área de responsabilidade da GNR, mais 500 quilómetros quadrados, mais 610 mil habitantes. Há um período de reajustamento, logo não se pode estabelecer uma comparação entre o primeiro trimestre deste ano e igual período do ano passado.
Mas não me lembro de a PSP ter alguma vez rejeitado ou mostrado má vontade por receber essa área da GNR.
Não viu porque nós nunca manifestámos qualquer problema.
A PSP ganhou mais protagonismo com as atribuições territoriais que pertenciam à GNR. Concorda?
Se temos mais 610 mil habitantes, naturalmente que há mais gente a ver a PSP do que a GNR, porque a GNR saiu de lá, mas não tenho essa perspectiva de protagonismo entre a GNR e a PSP.
Face ao acréscimo da criminalidade, a PSP mostrou algumas debilidades quanto a efectivos.
Quando tomei posse como director nacional da PSP, perguntaram-me se havia falta de efectivos e eu disse que sim. E o que pretendo fazer? Racionalizar os recursos que temos.
Os recursos não são infinitos. Chegam para tudo?
Chegam com dificuldade, mas hoje em dia nós já temos meios, como as equipas de intervenção rápida, o que permite a um oficial de operações, por exemplo, deslocar esses meios para uma zona onde se está a verificar um determinado tipo de crime.
Mas os homens são os mesmos e foram buscá-los às esquadras.
Claro que sim, e os homens, se ali fossem mantidos, com certeza que haveria nas esquadras muito mais homens, mas a eficácia era também menor, uma vez que não teríamos essa flexibilidade que é traduzida pelas equipas de intevenção rápida.
Então prefere ter as equipas concentradas do que dispersar os meios.
Exactamente, porque essas equipas podem ser deslocadas para as áreas onde o risco for considerado maior. É um fundo de maneio.
"As operações têm feito retrair os criminosos"
Há pouco mais de um ano assumiu o cargo de director nacional e a PSP reestruturou-se, mas é o período também em que a criminalidade subiu. Como é que se sente face a estas realidades?
Senti que era justificável porque nós ficámos com maior área, há aqui alguma proporcionalidade entre o número de habitantes e o número de crimes, sempre houve. Não me senti bem nem mal, gostaria que a criminalidade tivesse decrescido, mas a criminalidade varia por razões objectivas e claro que o facto de assumirmos maior área, maior população, teve influência.
Então a readaptação da PSP pode fazer baixar a criminalidade?
Poderá mas não é só isso que influencia o crescimento ou a descida do crime.
Qual o principal factor?
Há vários factores e depende da tipologia dos crimes.
A actividade grupal cresceu e está mais violenta. Porquê?
É realmente um problema, mas esses grupos já existiam, eles estão localizados, sabemos onde estão, e há dois ou três anos provavelmente seriam delinquência juvenil, eram menores. Por que é que se tornam mais violentos? Porque as pessoas já se defendem, os carros tornaram-se mais sofisticados em termos de segurança, é uma realidade. E os criminosos vão-se profissionalizando, mas também com cada vez menos consideração pelo ser humano.
E a facilidade de acesso a armas ilegais é real ou não?
O número de armas apreendido pela PSP aumentou substancialmente, portanto pode-se deduzir por esta realidade que há maior número de armas ilegais, mas também em contrapartida há um maior número de operações.
Mas essas operações acabam por recair mais sobre os condutores do que sobre a criminalidade grave.
Essas operações não têm apenas um fim, o álcool, há a verificação do porta-bagagens, de outros indícios, tudo isto transmite também segurança ao cidadão e faz com que os criminosos se retraiam, estão sempre perante uma operação inopinada.
Mas essas operações, que têm sido constantes, não são também um esforço excessivo?
A vida de polícia é muito sacrificada, mas faz parte da profissão.