Uma empresa que dá segundas opiniões relativas a pareceres médicos, sem observar os doentes, tem tido um aumento de procura de pessoas vindas sobretudo do privado, mas a Ordem dos Médicos e o regulador têm dúvidas sobre este procedimento.
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A Best Medical Opinion (BMOp) existe em Portugal desde 2010 e é uma empresa que emite "pareceres fundamentados, sobre documentação clínica". Em menos de dois anos, estes pedidos dispararam para mais do dobro.
A Ordem dos Médicos (OM) reconhece que a empresa trabalha com "médicos de prestígio", mas manifesta "reservas a segundas opiniões emitidas sem observação e interacção com os doentes e sem um conhecimento adequado do seu histórico", considerando tratar-se de "um acto médico incompleto".
A OM salienta que os médicos que "emitam uma segunda opinião sem observar os doentes podem estar a assumir uma grande responsabilidade" e a Entidade Reguladora da Saúde (ERS) admite que, se houver alguma consequência grave para um doente em função do parecer dado pela BMOp, a responsabilidade só pode ser imputada ao profissional em causa e nunca à empresa, porque esta "não está regulada por ninguém".
A ERS afirma que, na altura em que se constituiu, a BMOp quis saber se precisava de se registar, mas o regulador entendeu que não, precisamente porque a emissão de pareceres sem contacto com o doente não obrigava a essa formalidade.
No entanto, reconhece ter agora algumas dúvidas, afirmando estar a estudar a legislação e a aconselhar-se juridicamente para decidir "brevemente" se a empresa precisa afinal de se registar.
O preço de base por cada parecer da BMOp é de cem euros, mas o custo final pode ser muito superior: um doente que pediu à Best Medical Opinion um orçamento para um parecer médico por dúvidas quanto à hipótese de cirurgia, sem envio de exames ou de qualquer documentação, contou à Lusa que a empresa respondeu com um valor "que deverá ascender a 395 euros".
Segundo o director da BMOp, Pedro Meira e Cruz, o serviço é "personalizado e diferenciado", na medida em que há sempre uma conversa presencial, do ponto de vista administrativo, em que o doente apresenta todos os exames e informação de que dispõe.
"Pode existir uma conversa com o coordenador médico, responsável pelo parecer, mas não é uma consulta clínica", especificou o responsável.
No entanto, há circunstâncias em que pode existir uma consulta médica, mas fora do âmbito da BMOp.
Quando o doente pede uma perícia médico-legal para avaliação de dano corporal ou psíquico (em consequência, por exemplo, de acidentes), nomeadamente para aferir o grau de incapacidade, esta perícia é feita por peritos que colaboram com a BMOp.
"Os pareceres médicos são serviços prestados directamente pela BMOp, mas a perícia médico-legal não, é prestada através da BMOp, que faz apenas a assessoria", explicou.
Segundo Pedro Meira e Cruz, em 2010 a empresa "contava com cerca de uma centena de pedidos de pareceres médicos, mas em 2011 teve um aumento considerável, na ordem dos 120%".
Este aumento de procura, na opinião do responsável, deve-se não só a uma crescente desconfiança generalizada em relação ao sistema de saúde, no seu todo, fruto da crise de valores, financeira e social que se vive, mas também devido ao alargamento de serviços que esta empresa presta.
Inicialmente, a BMOp emitia apenas pareceres médicos, mas depois alargou o seu leque a outras áreas como as perícias médico-legais e a verificação de consumos.
Actualmente, cerca de 60% do actividade da empresa diz respeito a pareceres médicos, para esclarecer dúvidas, 30% a perícias médico-legais e perto de 10% a pedidos de confirmação de faturas de consumos hospitalares, como o internamento.
"Há uma grande parte de população que tem seguro de saúde, mas mesmo com comparticipação, há sempre uma parcela que tem de pagar do seu bolso. Pode haver alguma desconfiança em relação aos valores que aparecem na fatura", explicou.
Quanto à origem dos exames e pareceres iniciais que suscitam pedidos de segunda opinião à BMOp, são sobretudo de serviços de saúde privados, afirma Pedro Meira e Cruz, acrescentando que estes são "consideravelmente mais do que do sector público".