A maioria dos cirurgiões tem "pânico" de realizar operações como a que José Mestre, o português conhecido como "homem sem rosto", foi submetido em Chicago, pois "os pacientes correm elevado risco de vida", segundo o cirurgião Biscaia Braga.
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Em entrevista à Agência Lusa, Biscaia Fraga revelou que já realizou várias intervenções deste género em Portugal e que as mesmas são sempre "muito complicadas".
O cirurgião conhece a história de José Mestre, conhecido há vários anos no Rossio e Restauradores como o "homem sem rosto" e que foi recentemente operado nos Estados Unidos, tendo-lhe sido removido um tumor de 40 centímetros e 5,5 quilos, segundo noticiou a estação televisiva ABC.
O tumor, que cobria a maior parte do rosto e punha em risco a vida de José Mestre, foi retirado depois de três meses de preparação em Chicago, nos Estados Unidos, tendo sido necessárias quatro cirurgias.
Segundo Biscaia Fraga, trata-se de um hemangioma cavernoso, que é uma mal deformação congénita, constituída por vasos sanguíneos anormais, que cria aquela deformidade muito grave e monstruosa.
"É uma situação grave porque [a mal deformação] vai crescendo, ao ponto de tornar a pessoa um verdadeiro monstro", disse.
No caso de José Mestre, a deficiência era especialmente grave dada a sua localização na face que é "o cartão de visita da pessoa".
Biscaia Fraga defende a intervenção o mais cedo possível, preferencialmente antes dos dois anos. Quando tal não é possível, deve ser realizada antes da criança entrar na escolar "para evitar perturbações maiores na criança e nos outros alunos".
Sobre a intervenção, o médico explica que é "muito difícil e complicada" devido ao "doente poder morrer ao se esvair em sangue, dado que os vasos sanguíneos não têm os mecanismos normais de coagulação".
"A grande maioria dos cirurgiões tem autêntico pânico deste tipo de situações, em que o doente pode morrer de hemorragia incontrolável", explicou.
Antes da intervenção, são aplicadas técnicas inovadoras, como a embolização das veias lesadas, pelas quais são enviados produtos com o objectivo das artérias não terem tanto sangue, disse.
Biscaia Fraga chama a atenção para a segunda etapa deste processo que é a reconstrução e que é "muito difícil", dado "o terreno ser totalmente adverso".
Biscaia Fraga diz que já lhe passaram pelas mãos casos de grande destruição, como o de uma jovem com uma metade do rosto perfeito e muito bonito e a outra totalmente destruída.
A reconstrução é, nestes casos, fundamental, por "razões sociais, funcionais e estéticas".
A "cura" de José Mestre começou há dois quando, com 51 anos, foi convidado pelo canal de televisão Discovery para filmar em Londres um documentário sobre o seu problema.
O programa, intitulado "O homem sem cara", foi apresentado no início de Dezembro mostrando o rosto deformado do homem que costumava andar pela zona do Rossio, tendo o canal contactado dois médicos famosos nos hospitais de St. Bartholomew e de Broomfield para pedir opinião.
Ian Hutchison, o médico do St. Bartholomew consultado, ofereceu-se de imediato para fazer-lhe uma cirurgia inovadora, e de graça, para devolver a José Mestre o rosto que desde criança se vinha a deformar prometendo uma melhoria da qualidade de vida já que lhe possibilitaria respirar melhor, falar, comer e ver.
José Mestre, que foi submetido a duas cirurgias perigosas nos últimos dias para reconstruir o seu rosto, está ainda a recuperar, com o rosto envolto em gaze, mas já consegue deslocar-se sozinho e falar com dificuldade.
"Este foi provavelmente o maior tumor jamais retirado e, por isso, foi muito difícil fazê-lo sem deformar o rosto", explicou Ramsen Azizi, um dos cirurgiões que está a tratar do caso.
Em 2007, numa entrevista à Lusa, José Mestre contava uma parte da sua vida: "Há uma ou outra pessoa que se interessa pelo meu problema e vem falar comigo mas a maioria apenas quer tirar fotos e essa falta de respeito magoa-me".