Milhares de exames genéticos, alguns dos quais preventivos de doenças graves e até fatais, como o teste do pezinho, estão por fazer num laboratório do Instituto Ricardo Jorge, devido à falta de um reagente.
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A denúncia partiu da Associação Portuguesa de Fenilcetonúria e outras doenças Metabólicas (APOFEN), que revelou à Lusa que o diagnóstico precoce em Portugal está parado desde quinta-feira passada.
Classificando a situação de muito grave, o presidente da APOFEN, Rui Barros Silva, lembrou que o diagnóstico precoce -- que faz por exemplo o rastreio pré-natal e o teste do pezinho -- rastreia cerca de 27 doenças hereditárias do metabolismo, entre as quais a Leucinose ou a Doença do Ciclo da Ureia que podem conduzir à morte.
"Pode estar em causa a vida de cidadãos, caso existam nas 'fichas' por analisar algum portador destas doenças raras e crónicas, em que a acção médica específica deve ser implementada até ao 7º. dia de vida", afirmou.
Um dos mais conhecidos testes é o do pezinho, que deve ser feito até ao quarto ou quinto dia de vida, pois o tratamento, quando necessário deve iniciar-se nos primeiros dez dias.
Só em relação a este teste, entram no laboratório diariamente entre 400 e 500 amostras para análise, referiu à Lusa Rui Vaz Osório, fundador do diagnóstico precoce em Portugal e membro da sua comissão directiva, que confirmou a situação denunciada.
Tanto este responsável como o presidente da APOFEN afirmam que esta situação é da responsabilidade do Instituto Ricardo Jorge (INSA).
"O programa de diagnóstico precoce tem mais de 30 anos e sempre teve autonomia. Dependia do Ministério da Saúde quando estava sediado no Instituto de Genética Médica Jacinto de Magalhães, mas há anos atrás foi integrado no INSA e desde então começou a haver burocracia e problemas que não existiam, nomeadamente pagamentos em atraso", afirmou Rui Vaz Osório.
Este antigo director do Instituto de Genética Médica contou que desde a "anexação" já houve outras paragens, mas nunca durante tanto tempo.
"Os reagentes que faltam devem chegar hoje à tarde, mas foram despachadas para Lisboa, em vez de Porto, onde funciona o laboratório, o que implica que só começarão a funcionar na próxima semana", acrescentou.
O presidente da APOFEN lembra que o diagnóstico precoce em Portugal tem a "inigualável percentagem de cobertura de cerca de 99 % dos nascidos em Portugal".
As doenças rastreadas são do foro metabólico e implicam uma dieta restritíssima que deve ser aplicada logo nos primeiros dias de vida do bebé, explicou Rui Barros Silva, dando como exemplo a "benéfica amamentação que em determinados casos pode matar o bebé, ou provocar lesões no sistema nervoso central, conduzindo a deficiência mental profunda".
Rui Vaz Osório sublinhou ainda que, com esta semana de paragem, serão precisos meses para conseguir recuperar o atraso, já que estão em causa muitos milhares de análises.
Fonte do Instituto Ricardo Jorge confirmou este atraso, justificando-o com uma "ruptura no stock", mas adiantou que o fornecedor vai disponibilizar ainda hoje [quinta-feira]os reagentes, que vêm da Alemanha para Lisboa.
Comentando esta justificação, Rui Vaz Osório lembrou que em 30 anos o fornecedor nunca falhou, desde que o pedido seja feito atempadamente.