O aumento de casos de metapneumovírus humano (hMPV) na China fez soar os alarmes de todo o Mundo, com a ameaça de uma nova pandemia. Porém, ao contrário do SARS-CoV-2, este vírus é conhecido, existe há décadas e "não nos dá o arrepio do desconhecido". Segundo os especialistas, não há motivos para preocupação.
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Que vírus é e quais são os sintomas?
O metapneumovírus humano (hMPV) não surgiu agora. O vírus da família do vírus sincicial respiratório (VSR), que afeta milhares de crianças em Portugal todos os anos, foi identificado pela primeira vez nos Países Baixos, em 2001, embora circule há décadas. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), é um vírus "bastante comum" que causa sintomas "relativamente ligeiros" como tosse, febre, congestão nasal ou rouquidão. Porém, os casos mais graves podem causar pneumonia, sobretudo para doentes mais vulneráveis como crianças, idosos e pessoas com outras comorbilidades associadas.
Ao JN, Cândida Abreu, professora e investigadora da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) explica que este vírus respiratório "prolifera durante o inverno, nestas épocas de frio e de chuva" é conhecido há anos, pelo que "temos uma imunidade subjacente na comunidade", onde o vírus já circula.
Por que razão está na ordem do dia?
Ainda que não seja um vírus novo, o aumento de casos de hMPV no Norte da China, sobretudo em crianças com menos de 14 anos, fez soar os alarmes por todo o Mundo. Imagens a circular nas redes sociais, de hospitais chineses sobrelotados, repletos de doentes com máscaras, provocaram um "dejá vu" até 2020, com a preocupação de uma nova pandemia. A possibilidade já foi descartada por especialistas e autoridades internacionais.
O Centro Chinês de Controlo e Prevenção de Doenças reconheceu o aumento de casos de doenças respiratórias no país, na penúltima semana de 2024, com a gripe a ocupar o primeiro lugar, seguida do hMPV. Segundo a entidade, 5,4% dos pacientes hospitalizados com sintomas de gripe e constipação testaram positivo para o hMPV. Na China, quase todas as crianças são infetadas com o vírus até aos cinco anos.
De acordo com Cândida Abreu, o facto de o aumento de casos se verificar na China, onde foi detetado, em 2019, o SARS-CoV-2 (o vírus que dá origem à covid-19) impulsionou o alarmismo. "Claramente que isso preocupa as pessoas. Além disso, as imagens não foram tranquilizadoras. Falta é saber se essas imagens são reais, no sentido de serem de agora ou de outros tempos, nomeadamente da pandemia covid", sublinha a professora da FMUP.
Como se propaga e como evitar ficar doente?
Como outros vírus respiratórios comuns durante o inverno, o metapneumovírus humano propaga-se através de gotículas, contacto próximo ou superfícies contaminadas e o período de incubação varia de quatro a seis dias.
Ao contrário da gripe ou da covid-19, ainda não foi desenvolvida nenhuma vacina, pelo que a prevenção passa pelas precauções já conhecidas para as restantes infeções respiratórias: usar máscara em caso de doença, junto a pessoas infetadas, em espaços fechados com muita gente ou pouco ventilados; cumprir as regras de etiqueta respiratória, tossindo e espirrando com um lenço de papel ou com o cotovelo dobrado; lavar as mãos e as superfícies com frequência.
A investigadora Cândida Abreu considera que o mediatismo associado ao hMPV "é uma boa oportunidade para reforçar as medidas preventivas das infeções respiratórias e de lembrar que temos, ao nosso dispor, meios que são extremamente eficazes na redução e mitigação desses riscos".
Foram detetados casos em Portugal?
Sim. Segundo um boletim de vigilância epidemiológica da gripe do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, desde o início da época foi detetado um caso de hMPV. Numa resposta escrita enviada ao JN, a DGS sublinha que, "até à data, não há indicação de expressão do vírus hMPV em Portugal, apenas a deteção, pontual, de uma amostra na rede de vigilância laboratorial dos vírus respiratórios".
A professora da FMUP reforça ainda que o metapneumovírus faz parte do "pacote dos vírus respiratórios que costumam estar presentes no inverno" há anos, ao qual "não damos assim tanta importância", apesar de estar associado a infeções respiratórias pulmonares, como pneumonia, nalgumas pessoas mais imunodeprimidas.
Há razões para alarme? É igual à covid?
Para já, não. A OMS já afirmou não haver motivações de preocupação nos relatos do surto na China, apontando que se trata de um acontecimento sazonal habitual. Hans Kluge, o diretor do organismo para a Europa, disse na rede social X (antigo Twitter) que o impacto no sistema de saúde chinês, ao nível da escala e da intensidade do vírus, continua a ser inferior ao registado no ano anterior.
Cândida Abreu realça que, ao contrário do SARS-CoV-2, que apareceu pela primeira vez em 2019, o metapneumovírus não é novo, o que muda por completo a forma de avaliar o risco. "Faz toda a diferença e é, de facto, a mensagem mais importante. O vírus já circula há mais de 60 anos, é um vírus que nós conhecemos e, portanto, não nos dá o arrepio do desconhecido", explica.
A professora da FMUP sublinha que o hMPV "não é um salto do desconhecido", descartando o alarmismo social gerado. Para a investigadora é necessário "tranquilizar as pessoas e renovar as medidas de proteção destas infeções víricas, que as pessoas já conhecem".