Ao renunciar, Bento XVI criou o estatuto de Papa emérito e a Igreja Católica voltou a ter dois papas, embora em circunstâncias distintas daquelas no Grande Cisma do Ocidente, iniciado em 1378 quando Urbano VI liderava os católicos a partir de Roma, enquanto Clemente VII o fazia a partir da cidade francesa de Avignon.
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Apesar de ter recolhido a Castel Gandolfo no dia 28 de fevereiro de 2013, Joseph Ratzinger regressou ao Vaticano pouco tempo depois da eleição de Francisco, tornando inédita a coabitação de dois Papas na sede da Igreja Católica (passou a viver no mosteiro Mater Ecclesiae, em maio desse ano).
A relação entre ambos não terá sido tão animada quanto a que Fernando Meirelles ficcionou em "Dois Papas" (com Anthony Hopkins no papel de Bento XVI e Jonathan Pryce no de Jorge Mario Bergoglio). Ainda assim, o Papa argentino sempre revelou grande ternura pelo seu antecessor: foi a ele que ligou em primeiro lugar quando foi eleito e, nessa mesma noite, já na saudação aos fiéis que o aguardavam na Praça de S. Pedro - e depois de ter dado os primeiros sinais de bom humor ao dizer que os cardeais eleitores foram buscá-lo "quase ao fim do Mundo" -, Francisco pediu à multidão que fizesse com ele uma oração pelo Papa emérito.
No dia 16 de março de 2013, ainda Francisco não tinha assumido o pontificado (foi eleito a 13 e o ministério petrino começou no dia 19) e já o Vaticano fazia saber que o recém-eleito bispo de Roma ira visitar Bento XVI a Castel Gandolfo na semana seguinte. Ao sair do helicóptero, o sorriso, o abraço e a forma como pegou nas mãos de Joseph Ratzinger revelaram um toque de humildade da parte do argentino e fizeram crer, até, que o carinho era mútuo.
No ano seguinte, os dois estiveram na cerimónia de abertura de um encontro que reuniu 40 mil idosos de 20 países na Praça de S. Pedro. Mais uma oportunidade para Francisco revelar a estima pelo seu antecessor: "Agradecemos a presença do Papa emérito Bento XVI. Disse já muitas vezes que gostava que ele morasse no Vaticano, porque era como ter um avô sábio em casa".
Francisco citou-o por diversas vezes em relação a determinadas temáticas e louvou desde a primeira hora o facto de ter renunciado, assumindo ele próprio essa hipótese se a condição física a tal o obrigasse. Era comum visitá-lo e telefonar-lhe em alturas especiais. "Para ti, Bento, querido pai e irmão, vai o nosso afeto, a nossa gratidão e a nossa proximidade", disse Francisco após uma celebração, no dia em que passaram 70 anos sobre a ordenação de Ratzinger. Visitou-o em abril de 2022, na semana em que o alemão celebrou o 95º aniversário, tendo o gabinete de Imprensa do Vaticano referido que mantiveram uma "afetuosa conversa" e rezaram juntos.