Pontualidade é mais baixa desde que a Infraestrutura de Portugal começou a gerir a rede ferroviária. Obras e greve responsáveis por mau serviço
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Há cada vez mais passageiros a utilizar a ferrovia, mas o serviço também nunca esteve tão mau. O índice de pontualidade dos comboios roçou os 78,3% em 2024, estando a piorar consecutivamente desde 2022. O número nunca foi tão baixo desde que a Infraestruturas de Portugal (IP) passou a ser responsável pela Rede Ferroviária Nacional. As obras na ferrovia e as greves são apontadas como as principais causas para os constrangimentos. O balanço é feito numa altura em que os trabalhadores da CP estão no sétimo dia de greve que termina esta quarta-feira.
No ano passado, 21,7% dos comboios da CP - Comboios de Portugal e da Fertagus não cumpriram os horários estabelecidos pelos respetivos operadores. Estes números são os piores desde 2014, altura em que a fusão da Refer com a Estradas de Portugal (EP) deu lugar à Infraestururas de Portugal (IP). O índice de pontualidade ficou mesmo muito aquém da meta estabelecida pela empresa pública que apontava para os 90%. O "valor registado em 2024 é inferior ao de 2023 (83,3%), o que reflete o agravamento das condições em que a infraestrutura é disponibilizada para a circulação de comboios", lê-se no último relatório e contas da IP.
Os números refletem o serviço da CP que transporta passageiros em todo o país e da Fertagus que só explora o transporte suburbano entre as estações de Setúbal e Roma-Areeiro, em Lisboa.
Pandemia foi exceção
A verdade é que a diminuição da pontualidade verifica-se desde 2022, mas nunca se tinha situado abaixo dos 80%. Foi mesmo nos anos da pandemia, por via das restrições de circulação, que se registaram menos comboios atrasados: apenas 8% em 2021 e 2020. A par destes resultados estão os anos de 2015 e 2016, quando o Governo de António Costa tomou posse, e onde 93% e 91% das viagens realizadas cumpriram os horários, respetivamente. Em 2014, a taxa de pontualidade foi de 85%.
A contribuir para esta "fraca performance global" estão os tráfegos de médio curso, como os comboios suburbanos, com um índice de pontualidade de 64% e os suburbanos de Lisboa (86%). Mas há mais: o cenário piora nos serviços do Intercidades ou do Alfa Pendular. É que mais de metade destes comboios circulou sempre atrasado no ano passado.
Os tráfegos de Alta Qualidade registaram um índice de pontualidade de 34% e o Intercidades de 42%. Nestas viagens de longo curso da CP, os passageiros têm direito ao reembolso do bilhete quando se verifique um atraso igual ou superior a 60 minutos e o motivo seja imputável à empresa.
A CP - Comboios de Portugal refere ao JN que "há múltiplos fatores externos" que estão a agudizar o problema. "Obras de modernização e reparação de infraestruturas, situações imprevistas na via, incidentes com pessoas ou mesmo intempéries", enumera, acrescentando que o índice de pontualidade só da empresa pública foi de 74% em 2023 e 65% em 2024.
O relatório da IP aponta que as obras nos carris estão a ter influência. Na linha do Norte, por exemplo, foi necessário acrescentar 19 minutos de margens suplementares ao tempo de trajeto inicialmente definido. Em causa os trabalhos no troço entre Esmoriz e Vila Nova de Gaia que impõe limitações de velocidade.
Comboios suprimidos
Ao mesmo tempo, as greves também contribuem para esta degradação do serviço. Entre 2019 e 2023, foram suprimidos 62 795 comboios. Os dados da Autoridade para a Mobilidade e dos Transportes (AMT) apontam que mais de metade (35 076) não realizaram o serviço em 2023, um ano fortemente marcado por greves. Os serviços mais prejudicados foram os comboios urbanos de Lisboa (14 629), os regionais e inter-regionais (11473) e os urbanos do Porto (6855). Os de longo curso foram os menos afetados.
Já em 2024, a CP adianta que dos 425 492 comboios planeados foram suprimidos 11 004. Depois de dois anos de paz social, a greve que já dura há quase uma semana está a ter de novo um forte impacto na supressão e na pontualidade dos comboios.
Do primeiro ano com lucro ao recorde de passageiros
Nos dois primeiros meses do ano, a CP transportou 32 milhões de passageiros, mais 2,5 milhões do que no período homólogo. A procura elevada resultou em 35,2 milhões de euros de receitas, mais 2,5 milhões do que em janeiro e fevereiro de 2024. A CP transportou no último ano mais de 185 milhões de clientes, um aumento de 12,8 milhões face a 2023. Estes números coincidem com os primeiros anos positivos para a empresa pública. Segundo o jornal “Eco”, a CP fechou o ano de 2024 com capitais próprios positivos de 388 milhões de euros. O passivo baixou para 269,5 milhões. O primeiro lucro da história da empresa foi em 2022.