A ministra da Saúde referiu esta quarta-feira no Parlamento que os hospitais do Serviço Nacional de Saúde não têm um sistema de contabilidade analítica que permita perceber o custo de uma consulta, de uma ecografia ou de uma cirurgia. E por isso não sabe se o SNS é bem gerido ou não.
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"Não sei se é bem gerido ou não com os dados que tenho", afirmou Ana Paula Martins, considerando que é "uma questão de ética" ter dados para "explicar às pessoas porque injetamos 16,7 mil milhões de euros por ano na Saúde e no final do ano injetamos mais mil milhões para pagar dívida".
"Ao fim destes anos todos, não temos um sistema de contabilidade analítica nos hospitais", referiu a ministra, dirigindo-se num tom crítico ao PS, que esteve no Governo nos últimos oito anos.
Ana Paula Martins acabou por relacionar a falta deste sistema com a suborçamentação do SNS. Explicando que "alguns dados" compreensivos sobre os custos das consultas, ecografias e procedimentos cirúrgicos "não estão devidamente atualizados e por isso temos suborçamentação".
Numa audição sobre o uso abusivo do SNS por estrangeiros, a discussão acabou por centrar-se na falta de dados e informação.
E o tema prolongou-se na audição seguinte - sobre os obstáculos criados no acesso ao SNS, a requerimento do BE - com o PSD a alegar que "é de pasmar" que o SNS tenha sido gerido nos últimos anos sem dados e a Iniciativa Liberal a sublinhar que é importante garantir a contabilidade analítica nos hospitais.
Estudos sobre desperdício e eficiência
Na resposta, a secretária de Estado para a Gestão da Saúde referiu que o SNS tem um problema de "completude, fiabilidade e consistência" dos dados. Cristina Vaz Tomé adiantou que "a questão da contabilidade analítica é urgente", sendo um trabalho que está a ser realizado no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
A governante acrescentou que foi criado um grupo de trabalho para o combate ao desperdício no SNS e outro para aumentar a eficiência. Está ainda a ser estudado o sistema de informação de gestão de recursos humanos que o SNS precisa, ao nível central.
Ainda na audição sobre Turismo de Saúde - pedida pelo Chega - a ministra notou que a falta de dados impede também os hospitais de conseguirem identificar, no caso dos estrangeiros, quem são as entidades financeiramente responsáveis para que possam proceder à cobrança dos cuidados prestados.
40% dos estrangeiros atendidos sem cobertura
A ministra citou dados da Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS), para adiantar que, entre 2021 e 2024, o SNS atendeu 330 mil estrangeiros, dos quais 139 mil não estavam cobertos por seguros ou protocolos de cooperação com o SNS.
"Com os dados que temos hoje, sabemos que cerca de 40% dos estrangeiros que recorrem ao SNS não têm nem protocolos de cooperação, nem seguros", afirmou Ana Paula Martins, adiantando que a IGAS está a aprofundar a informação, para detalhar as nacionalidades, quanto custaram estes episódios na urgência e eventuais referenciações para outro nível de cuidados.
Apesar do aumento do uso do SNS por estrangeiros face a 2021, a ministra, quando questionada pela deputada Susana Correia do PS, acabou por reconhecer que parece ser uma "parte ínfima" dos cerca de seis milhões de urgências realizadas por ano no SNS.
Profissionais não serão polícias
Ana Paula Martins garantiu ainda que, de acordo com a legislação em vigor, todos os doentes, com ou sem cobertura de seguros ou ao abrigo de protocolos, são atendidos nas urgências.
E que não caberá aos profissionais de saúde serem polícias para decidir quem são os estrangeiros que vão ser admitidos nas urgências do SNS.
Também esclareceu que, nos casos em que as unidades locais de saúde (ULS) não conseguirem identificar as entidades financeiramente responsáveis pelos cuidados prestados ao cidadão estrangeiro, será a Administração Central do Sistema de Saúde a assumir o encargo porque as ULS não têm capitação para estes doentes.