Comissão de Proteção de Menores da Arquidiocese de Braga recebeu duas queixas formais contra Fernando Sousa e Silva. Vítima revela ao JN que "confissão era um martírio".
Fernando Sousa e Silva, o padre acusado de abuso sexual de crianças na paróquia de Joane, em Vila Nova de Famalicão, desde a década de 60 do século passado, foi afastado de todas as suas funções e de celebrar qualquer sacramento. A pena decidida pelo Dicastério para a Doutrina da Fé, comunicada este sábado pela Arquidiocese de Braga, surge depois de, no início deste ano, o mesmo padre ter sido proibido de celebrar missa em público.
As denúncias das alegadas vítimas, agora com idades acima dos 30 anos, têm surgido em catadupa nos últimos dias, mas o sacerdote, atualmente com 90 anos, chegou a ser denunciado ao então arcebispo de Braga, D. Jorge Ortiga, entre 1999 e 2002. Segundo uma reportagem da RTP, em 2010, houve uma nova carta enviada ao prelado a sensibilizar para a possibilidade de haver "centenas de vítimas".
"A confissão era um martírio. Entrava no confessionário, ele fechava a cortina e começava logo com perguntas sobre sexo. Eu tinha sete anos, nem sabia do que é que ele estava a falar", recorda Helena Pereira, de 39 anos, ao JN. Foi uma das alegadas vítimas do padre Fernando Sousa Silva, que "só queria saber coisas sobre sexo, o que fazíamos com os rapazes, quem é que nos tirava a roupa, coisas assim. Não queria saber mais nada, era meia hora a falar disto", recorda.
Nessa altura, acrescenta ainda Helena Pereira, "entre as raparigas da catequese, combinamos dizer que sim a tudo que ele perguntasse para o confesso acabar mais depressa e era isso que fazíamos".
À RTP, outras vozes da freguesia de Joane fizeram-se ouvir. Para além das perguntas de cariz sexual, há quem relate que o cónego, que foi juiz do Tribunal Eclesiástico de Braga, "passava as mãos nas pernas" das crianças ou quem admita que os menores chegavam a ter que pôr a cabeça "debaixo do saiote".
Duas queixas formais
A Arquidiocese de Braga reconhece que, neste caso, "a Igreja falhou no seu dever de proteger os mais frágeis e vulneráveis". Concretamente, os responsáveis adiantam que a Comissão de Proteção de Menores e Adultos Vulneráveis, até ao momento, recebeu duas queixas formais, uma em novembro de 2019 - que revelou haver a existência de outras vítimas - e outra no ano passado.
"Confrontamo-nos, agora, com o elevado número de casos relatados pela comunicação social", refere a Arquidiocese, em comunicado, prometendo avançar com um serviço de escuta que estará na paróquia de Joane de forma presencial, mas também disponível via telefónica ou por correio eletrónico.
"A Arquidiocese de Braga dirige-se, em primeiro lugar, a todas as vítimas, feridas física, emocional e espiritualmente pelos abusos sofridos, a quem com profunda tristeza e humildade pede perdão. Do mesmo modo, a Arquidiocese dirige-se às suas famílias, bem como aos agentes pastorais da Paróquia de Joane e a toda a comunidade cristã, pedindo perdão pelo sofrimento causado por estes acontecimentos", escreve o prelado em comunicado.
Na mesma nota, os responsáveis lamentam "[não terem conseguido] ser mais céleres no tratamento do caso e mais eficazes no acompanhamento das vítimas". Concretamente, desde as primeiras denúncias, passaram cerca de 20 anos.
Às possíveis vítimas de abusos sexuais, a Arquidiocese pede para contactar a Comissão de Proteção de Menores e Adultos Vulneráveis (comissao.menores@arquidiocese-braga.pt ou 913 596 668).