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Professores desiludidos temem que muitos desistam da profissão

Professores concentram-se na Praça da Sé, onde pediram novo regime de aposentação Artur Machado / Global Imagens

O presidente da República promulgou esta segunda-feira o diploma de concursos apenas para "não frustrar as expectativas" de oito mil professores entrarem nos quadros mas diretores e dirigentes sindicais alertam que muitos docentes admitem desistir da profissão ou recusar entrar nos quadros para tentarem ficar perto de casa.

Na nota publicada na página da presidência, o presidente assumiu ter feito propostas de alteração ao diploma para evitar a criação de mais "desigualdades" mas que o Governo rejeitou todas. Marcelo Rebelo de Sousa pede estabilidade para o próximo ano letivo "não ser acidentado" como os últimos, mas diretores e líderes sindicais alertam que a tensão nas escolas só vai piorar.

O presidente apelou ao Executivo para negociar a recuperação faseada do tempo de serviço que o Governo tem rejeitado pôr em cima da mesa por não estar previsto no seu programa. A ronda suplementar relativa à proposta que pretende mitigar efeitos do congelamento e acelerar as progressões de alguns docentes vai realizar-se na próxima segunda-feira.

Dirigentes e diretores rebatem argumentos e recados do presidente. Alegam que a vinculação dos oito mil docentes podia ser feita através de um concurso extraordinário e avisam que não entram "em jogos políticos" entre Belém e São Bento.

"São jogos de palavras mas não vale a pena ter ilusões: quando chega o momento, fica tudo na mesma", critica o líder da Fenprof, Mário Nogueira, insistindo que só a contestação conseguirá impor mudanças. O vice-secretário-geral da FNE, Pedro Barreiros, avisa que os protestos vão manter-se para lá dos exames e passar para o próximo ano letivo sem a recuperação do tempo.

"Se o Governo não acolheu nenhuma proposta, mais um motivo para vetar", defende André Pestana. O líder do S.TO.P. acusa o presidente de ser conivente com o Governo no "maior ataque aos docentes". "Os dois estão juntos apesar de dizerem que não", afirma.

O primeiro-ministro congratulou-se com a decisão. No Twitter, António Costa escreveu que, para muitos, vão "acabar os dias de casa às costas". "Mentira" - garantem dirigentes e diretores.

"Colher de xarope"

"Vai ser particularmente negativo para os professores do Norte", alerta Nogueira, por ser a região com mais docentes que terão de se deslocar para Sul e ter o reaproximar a casa mais condicionado pelas novas regras. O número de vagas será determinante para avaliar o impacto, frisa.

Os docentes que entrarem nos quadros em setembro vão ter de concorrer para o país inteiro no próximo ano. Há docentes que admitem desistir da profissão ou não concorrer porque preferem dar aulas, como contratados, mais perto de casa. Nogueira alerta para o risco de além dessa decisão poder permitir ultrapassagens na carreira por vincularem docentes mais novos, o número de contratos poder diminuir devido à possibilidade de acumulação de horários em diferentes agrupamentos.

"Pode ser trágico", admite o presidente da associação de dirigentes escolares (ANDE), Manuel Pereira. O presidente da associação de diretores (ANDAEP), Filinto Lima, critica não terem sido ouvidos. Os dois contestam os novos conselhos que vão permitir a acumulação de horários em agrupamentos diferentes.
Diretores, Fenprof, FNE e S.TO.P. garantem que a desistência de muitos docentes vai agravar a falta de profissionais que já deixa milhares de alunos sem aulas. "Precisamos de um antídoto e não de uma colher de xarope", critica Filinto Lima.

Alexandra Inácio