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"Antigamente, em qualquer feira ou festa se jogava o pau. E, se fosse a brincar, batiam nos paus, quando se zangavam batiam no lombo que não era brincadeira. Está bem, está!". A recordação é de um dos muitos septuagenários da aldeia de Corva, em Salto (Montalegre) e tem já várias décadas. Na altura, mais do que uma diversão, o jogo do pau era utilizado como arma de defesa.
Hoje, depois de quase ter caído no esquecimento, o jogo do pau transformou-se num espectáculo, que levou, inclusivamente, à criação de uma associação que luta pela sua preservação. Com menos de meia dúzia de anos de existência, a Associação Recreativa e Cultural do Jogo do Pau de Salto, sedeada na localidade de Corva, é a única em todo o concelho de Montalegre que preserva esta tradição.
Queixando-se dos poucos apoios que tem recebido, o presidente da Associação sonha, agora, com uma sede. E nem precisava de ser um edifício de raiz. João Poças, de 28 anos, que é também quem ensaia os restantes elementos do grupo, já ficava satisfeito com a antiga cozinha da escola primária, um espaço que não está a ser utilizado, e onde diz que seria apenas necessário colocar uma secretária e um computador.
Mas em que consiste, afinal, o jogo do pau? Para João Poças é uma arte marcial igual ao karaté, por exemplo, que, hoje, se transformou numa espécie de arte, porque deixou de ser utilizada como defesa.
No entanto, as regras combativas mantêm-se "Olho aberto e força nos membros", recorda João. E a perigosidade também. Tanto assim é que já aconteceu de o pau errar o alvo, ou seja, o outro pau, e obrigar a parar o ensaio e a correr para o hospital com o ferido. Ciente do carácter violento do jogo, sempre que há um incidente e alguém, mesmo que sem querer, magoa outro elemento, João Poças obriga a que haja um cumprimento entre os envolvidos e um pedido de desculpa.
"O propósito da associação e do jogo do pau não é incitar à violência. Antes pelo contrário. Aquilo que pretendemos é que estes jovens ocupem o tempo de uma forma saudável e que evitem, por exemplo, cair no vício da droga", explica João Poças.
O elemento base do jogo, que pode assumir várias modalidades (um contra um, um contra quatro, quatro contra quatro?), como o nome indica, é o pau. Mas não um qualquer. O ideal é o da árvore localmente conhecida por lódo, porque combina duas características essenciais a resistência e a flexibilidade. Aliás, para o pau se vergar melhor há até quem regue o pau com azeite.
Os ensaios do grupo decorrem uma vez por semana, ao domingo, no recreio da escola primária. E a maioria dos elementos que o compõem são jovens. O mais novo tem sete anos e o mais velho 33.
As actuações dependem dos convites. Além de uma passagem pela Expo 98, o grupo do jogo de pau de Salto já actuou em Beja, Mértola, entre outras cidades do país. O último espectáculo aconteceu no passado dia 22, em Cabeceiras de Basto.