Talvez Paula Teixeira da Cruz não seja pior ministra que Alberto Costa ou Alberto Martins e muitos outros nomes que passaram pelo Ministério da Justiça nos últimos anos. Haveria uma lista infindável de personagens que não deixaram uma marca de modernidade no sistema.
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Mas este caso da paralisação do sistema judicial é diferente. Como se pode ler nas respostas abaixo, não foi uma falha informática (que pode sempre suceder) ou um problema de obsolescência do sistema. O "Citius" foi muito pior. Trata-se de uma total falta de programação para se fazer a anunciadíssima alteração do mapa judiciário. A ministra nunca chegou a perceber o que significava uma tal reforma - ou se percebeu o que ela significava, não planeou. Em ambos os casos este momento é apenas mais um, o enésimo, no mais caótico sistema público português, o judicial.
[perguntas]
[1] Como explicar uma falha tão grave e tão prolongada no programa informático que gere os processos nos tribunais portugueses?
[2] A ministra da Justiça deveria demitir-se?
[respostas]
Agostinho Guedes, professor da Faculdade de Direito da Universidade Católica do Porto
[1] Parece-me falta de previsão, planeamento e preparação das condições necessárias para a boa execução de todas as tarefas que eram necessárias para levar a bom termo todas as alterações impostas pelo novo mapa judiciário. O Ministério da Justiça podia e devia ter feito melhor.
[2] É à Ministra que incumbe avaliar se ainda tem condições ou não para exercer a sua função. Em todo o caso, a demitir-se, só deveria fazê-lo depois de resolver os problemas ligados ao sistema informático.
Alberto Pinto Nogueira, procurador-geral adjunto
[1] Chama-se incompetência. O mais grave é que reflecte desrespeito pelo direito à Justiça dos cidadãos. È assim que os políticos acham que nos podem tratar! Sem respeito nenhum pelo sistema democrático.
[2] Deve é corrigir o que fez e rapidamente, em vez de vir choramingar desculpas. Demitir-se depois que isso é que é assumir responsabilidades políticas. A sua imagem como política esta definitivamente descredibilizada.
Joana Pascoal, advogada e presidente da Associação Jovens Advogados
1. Incompetência. Seja na programação, na implementação da reforma, na incapacidade de prever falhas ou na morosidade em resolvê-las. É inaceitável uma delonga de quase um mês, enquanto processos cíveis e executivos, i.e. direitos e expectativas de cidadãos, (des)esperam.
2. Mais do que demissões, necessitamos de responsabilidade e soluções. É prioritário restabelecer a normalidade no funcionamento da Justiça Cível. Haverá tempo para apurar responsabilidades e demitir culpados.
Carlos Moreno, juiz jubilado do Tribunal de Contas e professor de Finanças Públicas
[1] Não tenho qualquer explicação para o apagão do Citus. Seria imperativo dispor de explicações públicas, claras e precisas, sobre o sucedido e de ter garantias de que serão encontradas soluções rápidas e eficazes para o problema e apuradas responsabilidades pelo evidente mau gasto de dinheiros públicos.
[2] Assumir responsabilidades políticas concretizadas na demissão é inquestionável nas democracias substanciais e normal nos países anglo-saxónicos. Por cá não existem essas práticas saudáveis. Eu demitir-me-ia.
Luísa Neto, jurista e professora associada da Fac. Direito da Universidade do Porto
[1] Ainda que se distinga a reforma da respectiva plataforma informática de suporte, parece clara a falta de planeamento técnico detalhado e a menorização de avisos precavidos, com consequências reais e a reclamar urgente solução.
[2] É censurável a "minimização semântica" bem como a imputação de responsabilidades a outrem, ainda que a demissão - com o que sempre implica uma mudança - arriscasse no imediato tornar a situação mais insustentável.
Manuel Sousa, presidente da delegação do Porto do Sindicato dos Funcionários Judiciais
[1] Incompetência e desleixo. Houve sucessivos alertas dos funcionários judiciais. Ninguém quis saber. A ministra, como advogada, tem a obrigação de saber que um processo de um tribunal só pode ser remetido para outro; ora, antes de 1 de setembro os novos tribunais não existiam! Como tinha já sido iniciada a transferência eletrónica dos processos? Transferidos para onde? Para o éter?
[2] A ministra tem cada vez menos espaço de manobra. Mas a sua saída, agora, seria ainda pior.
Maria Manuela Silva, diretora do Departamento de Direito da Universidade Portucalense
[1] Só os encarregados de tal processo poderão e deverão explicar. No entanto, dada a dimensão e número de processos em causa, o espaço temporal pode não ter sido o suficiente para a transposição dos mesmos para os respetivos tribunais.
[2]Acredito que as previsões que o Ministério tinha não correspondessem ao que se está a passar. Devem ser investigadas as causas e os responsáveis.