A RELI - Rede de Livrarias Independentes, endereçou uma carta aberta aos órgãos de soberania, com um conjunto de propostas para ajudar os livreiros a sobreviver à crise, nomeadamente medidas de apoio à tesouraria e rendas.
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Numa altura em que as livrarias enfrentam um grave período de crise, com as portas fechadas por tempo indeterminado, devido às medidas restritivas impostas pelo Governo para mitigar a propagação do coronavírus responsável pela pandemia covid-19, dezenas de livreiros uniram-se e elaboraram um conjunto de reivindicações para ajudar a salvar o setor.
Umas são "emergenciais", de execução imediata, e outras são "estruturais", para serem aplicadas no termo dos efeitos da pandemia, refere a carta, enviada aos jornalistas.
Entre as medidas mais urgentes preconizadas pela RELI estão a garantia da extensão às livrarias independentes das medidas governamentais de apoio à tesouraria que forem aprovadas para o comércio em geral.
A ideia é assegurar que "a banca não exclui o pequeno comércio das candidaturas às linhas de financiamento".
Os livreiros apelam também a que as compras institucionais - livros e revistas para as bibliotecas públicas, escolares, ou municipais -- sejam feitas através de consultas preferenciais às livrarias independentes, "mesmo em situações de encerramento temporário forçado", de acordo com a sua proximidade e não de acordo com o preço.
A este propósito destacam que o preço deveria ser o do Preço de Venda ao Público (PVP) dos livros ou fixado num desconto mínimo (máximo de 10%) de modo a facilitar e não impedir a participação dos livreiros independentes nas consultas públicas.
"Todos sabemos que não é possível exigir dos livreiros descontos que são muitas vezes iguais ou superiores aos que as condições comerciais praticadas pelas grandes editoras nos permitem", salientam.
As rendas e o risco de despejo são outras das principais preocupações deste setor livreiro, pelo que a RELI pede apoios financeiros a fundo perdido para reforçar a tesouraria ou ao pagamento das rendas, em articulação com as medidas que vierem a ser aprovadas para o comércio em geral, para a restauração e hotelaria, para as micro e pequenas empresas.
Os livreiros recordam que a especulação imobiliária foi a primeira responsável pelo encerramento de muitas livrarias independentes e do comércio de proximidade em geral, pelo que, "nos tempos que virão, esta é uma cautela que os governos e as autarquias têm que assegurar".
Os livreiros sugerem também que lhes sejam atribuídos "seguros de salários, ou equivalente, de modo a garantir um rendimento mínimo a todos", enquanto os efeitos da epidemia durarem.
"Em caso de 'layoff' ou situação equivalente os rendimentos mínimos devem contemplar, obrigatoriamente, os sócios-gerentes das micro e pequenas empresas", já que muitas vezes esses são os únicos trabalhadores efetivos nos estabelecimentos, e a sua sobrevivência depende exclusivamente do exercício dessa atividade.
Outra das reivindicações preconizadas na carta diz respeito ao apoio direto à constituição da Associação RELI, nomeadamente para construção de um 'site' com venda 'online' e georreferenciação das livrarias aderentes à rede, "o qual constituirá o embrião de uma central de compras e de distribuição".
Ainda no âmbito das medidas urgentes, os livreiros exigem o cumprimento da lei do preço fixo, mesmo em tempos de emergência, quer por parte de algumas grandes cadeias de livrarias 'online' --- "que praticam descontos acima dos permitidos pela lei ---, quer pelas próprias editoras --- que concorrem com os 'sites' das livrarias através da venda a retalho nos seus próprios sites".
Questionado sobre a decisão de algumas editoras/distribuidoras adotarem medidas que proteção aos livreiros, como o adiamento de prazos de pagamentos, José Pinho, da Livraria Ler Devagar, disse à Lusa que "o problema é o adiamento do problema".
"Como nas rendas, no 'layoff', nos empréstimos que não forem a fundo perdido, ou noutra área qualquer, todas estas medidas que até parecem simpáticas e solidárias não passam de medidas proporcionadoras de acumulação de dívida contraídas por empresas que provavelmente, não vendendo, nem daqui a dois ou três anos estarão em condições de a amortizar", afirmou.
A carta aberta dispõe ainda de uma série de propostas de medidas estruturais, que os livreiros consideram que, a seu tempo, terão obrigatoriamente de ser discutidas "franca e abertamente" no sentido de evitar, de vez, "alguns dos procedimentos que impedem as boas práticas da concorrência".
Por um lado, querem que seja facilitada a participação dos livreiros independentes nas feiras do livro e que seja fiscalizada a aplicação de descontos ilegais.
Ainda no mesmo âmbito, exigem a fiscalização da atividade comercial de venda a retalho de livros, através do Inspeção-Geral das Atividades Culturais (IGAC) e da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE), para impedir a prática de descontos pontuais acima do permitido e de promoções de duração superior ao estipulado na Lei do Preço Fixo.
No que respeita ao livro escolar, os livreiros apontam a venda ao público feita diretamente pelas editoras de livro escolar e os 'vouchers' do Ministério da Educação "que deveria ter sido uma medida para apoiar a rede livreira e afinal não foi".
Apelam ainda à instalação de novas livrarias, e das que vierem eventualmente a ser despejadas quando terminar o estado de emergência e de calamidade pública, em edifícios que sejam propriedade do Estado, das autarquias e de fundações ou instituições privadas dependentes do Orçamento do Estado.
A carta aberta foi dirigida aos presidentes da República e da Assembleia da República, ao primeiro-ministro, à ministra da Cultura e aos grupos parlamentares da Assembleia da República, com conhecimento dos presidentes das câmaras de Lisboa e Porto, da Associação Nacional dos Municípios e da Associação Portuguesa de Editores e Livreiros.