Poeta cimeiro do surrealismo português é o destaque dos 58 nomes que, desde janeiro deste ano, estão libertos de direitos autorais.
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Em comum têm o ano da morte (1953) e o esquecimento em que caíram os seus livros. Mas na lista de 58 escritores portugueses cujas obras entraram no domínio público (consultar alguns dos nomes ao lado), cumpridos 70 anos sobre o seu falecimento, encontramos também António Maria Lisboa.
A morte precoce, aos 25 anos, não atrapalhou a posteridade da obra do mais insubmisso dos surrealistas portugueses, incensado por nomes como Mário Cesariny de Vasconcelos (responsável pela primeira reunião antológica da sua poesia, em 1962), Luiz Pacheco (editor do referido volume) ou António José Forte.
Em Paris, onde viveu durante um curto período em 1949, António Maria Lisboa teve os primeiros contactos com a egiptologia ou o hinduísmo, que trouxeram à sua escrita uma dimensão esotérica incomum e incutiram-lhe um forte cunho de originalidade.
Com as obras libertas de direitos autorais, é de prever que possa haver alguma movimentação editorial em torno dos seus livros, mas, em bom rigor, a poesia do autor de “Ossóptico” nunca esteve afastada dos escaparates das livrarias.
Há dois anos, a Assírio e Alvim reuniu a criação poética de um autor que “deixou uma obra escassa mas nem por isso menos fulgurante”, como assinalou a editora.
Igualmente significativa foi a edição, em 2017, de “António Maria Lisboa, eterno amoroso”. O ensaio, da autoria da investigadora e poetisa Joana Lima, traça o intrincado itinerário pessoal e literário do poeta que lançou bases para correntes que só seriam exploradas após a sua morte.
“Formar e informar”
Há mais de uma década que as listas de autores portugueses em domínio público são divulgadas no início de cada ano. Se esse trabalho começou por resultar da ação dos investigadores Paula Simões e de Marcos Marado – inicialmente através da Associação Ensino Livre e depois em conjunto com a Associação Nacional de Software Livre –, desde 2022 passou a haver uma conjugação com a Wikimedia Portugal. A partir do ano passado, a Biblioteca Nacional também se juntou a esses esforços.
Para que a lista prime pelo maior rigor possível, os seus promotores fazem uma pesquisa exaustiva junto de bases de dados alargadas.
André Barbosa, da Wikimedia Portugal, explica ao JN que, após a publicação das listagens, há inúmeros procedimentos a adotar. “As listas são comparadas para verificar se faltam autores em alguma das bases de dados e trabalhadas no sentido de se desenvolver o máximo de informação sobre os autores e as obras”.
A 5 de janeiro, as instituições envolvidas comemoraram o Dia do Domínio Público com um conjunto alargado de iniciativas, que incluíram palestras e oficinas.
Uma das novidades foi a associação com a Wikimedia Espanha, que resultou numa maratona de autores ibéricos, promovendo a criação e tradução de textos das várias línguas nestes territórios.
De simples curiosidade, a efeméride tem adquirido uma importância crescente. Junto dos meios mais técnicos, como bibliotecários e académicos, mas também para um público generalista. Quem também costuma estar atento a estas listas são os editores, para que possam estar a par dos novos autores incluídos. Só nos últimos anos, George Orwell, Knut Hamsun ou André Gide passaram a poder ser publicados livremente.
Apesar do maior interesse, André Barbosa observa que subsiste “um desconhecimento sobre as licenças livres no seu geral e o domínio público incluído”. Por isso, esta entidade filantrópica elege como principais campos de ação a formação e informação em licenças de conteúdo que possa ser usado livremente, as chamadas licenças abertas.