Realizador da nova geração da Geórgia falou com o JN sobre "O Que Vemos Quando Olhamos para o Céu?".
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Aleksandre Koberidze tem 38 anos e faz parte da nova geração de realizadores georgianos. O seu novo filme, "O que vemos quando olhamos para o céu?", encontra-se em exibição nos cinemas, depois de ter sido uma das boas surpresas do Festival de Berlim de 2021.
Ao sair da escola, dois jovens chocam e um deles deixa cair um livro. A situação repete-se e decidem marcar um encontro. Mas uma maldição vai fazê-los mudar de aparência. À hora e local marcados, não se reconhecem. O realizador falou com o JN sobre esta fábula contemporânea.
Pode falar um pouco sobre a escolha de um narrador? Parece mesmo que está a contar-nos uma história, algo que se perdeu um pouco no cinema.
É um exercício que tenho vindo a praticar desde que fiz o primeiro filme, aos 18 anos. Não sei de onde me veio essa ideia, já tentei livrar-me do narrador, mas não consigo. A minha avó contava-me histórias, habituei-me desde muito novo a isso. Talvez no próximo filme tente não ter narrador, mas não prometo. E desta vez sou eu próprio a fazer a narração, tive aulas para falar de forma correta.
Por vezes, nos genéricos, lemos "história original de", mas não é original. O seu filme é mesmo original. De onde lhe veio esta ideia?
Estava a escrever uma outra história, também do género do conto de fadas. Comecei então a ler muitos contos de fadas. É o tipo de filmes que quero fazer, não sei bem porquê. Talvez tenha sido uma ideia que me veio à noite, antes de dormir.
Este seu filme será um conto de fadas, mas fala sobre a vida de todos os dias...
Sim, também decidi que se queria fazer um filme deste género, tinha de ser um conto de fadas moderno. Tinha de ter a ver com o tempo em que vivemos. A vida de todos os dias pode tornar-se mágica. Quando estes dois elementos, o realismo e a magia, se misturam, tem um impacto sobre as pessoas.
O que o interessou no formato dos contos de fadas?
Estou muito atento a coisas que se passam à minha volta e a coisas que me contam. É claro que nunca conheci ninguém que tivesse acordado com um corpo diferente ou alguém que tivesse mudado de aparência, mas creio que situações como estas podem acontecer. Quis dar espaço a possibilidades como estas. Que não fosse uma coisa do outro mundo, apenas saída da minha cabeça, mas que estivesse ao nosso alcance.
Os atores que vemos mais tempo estão a representar o papel de outros que vimos no início. Como é que trabalhou com eles?
Não foi nada fácil. A abordagem foi diferente. O rapaz que vemos mais é ator profissional e eu passei muito tempo com ele, como se fosse o outro rapaz. Ele foi apanhando coisas aqui e ali. Com as raparigas foi diferente, porque nenhuma delas é atriz. É curioso porque me disseram que eram muito parecidas, mas movem-se de maneiras muito diferentes. É interessante ver as suas semelhanças, mas também as suas diferenças.
O espectador também pode ver a história como um filme de suspense?
Penso que sim. Cada espectador estará sempre a pensar se eles vão encontrar-se ou não. Como não tenho essa distância em relação ao filme, é muito interessante, para mim, perceber como é que os espectadores se relacionam com a história. Espero que funcione.
As suas personagens aceitam sem grandes traumas o facto de terem um novo corpo, uma nova vida...
Quando comecei a escrever a história, havia mais reações da parte deles. Mas, aos poucos, também pensei que seria interessante que eles não fizessem uma grande tragédia dos seus próprios problemas. Pelo menos, que não o demonstrassem aos outros. Quando estão sozinhos, em casa, podem chorar à vontade.
O filme também presta homenagem ao próprio cinema. Sabemos que estamos a ver um filme, porque num determinado momento vemos parte da equipa a trabalhar.
Quando tive esta ideia de duas pessoas acordarem com outro corpo, estive ainda alguns dias a pensar em como poderia ser a solução, nos nossos dias. Como é que eles poderiam quebrar essa maldição. No filme vemos que ninguém pode ajudá-los. E pensei que talvez o cinema pudesse fazê-lo. O cinema também é magia. Como é que as pessoas aparecem no ecrã? Como é que 24 imagens fixas dão a ideia de movimento?
A certa altura, o futebol é também um elemento importante no filme. Não sabia que as pessoas na Geórgia adoravam assim tanto o futebol.
Filmámos duas semanas ao estilo de documentário e estava a decorrer o campeonato do Mundo de 2018. Queria mostrar como é que as pessoas veem futebol na Geórgia. Durante o período da União Soviética, havia equipas boas e muitos fãs. Toda a gente via futebol. Hoje as equipas já não são tão boas e as pessoas começaram a ver o futebol internacional.