A forma como olhamos os outros é explorada em “Para que serve esta mánica?”, obra que vai ser apresentada este sábado à noite, na Fábrica das Ideias, na Gafanha da Nazaré, Ílhavo.
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Uma nave com um alien despenha-se numa cidade. Como é que a comunidade o aceita? E como é que cada um dos habitantes daquele lugar recebe o inesperado visitante? É dessa premissa que parte “Para que serve esta mánica?”, um livro infantil da autoria da radialista e escritora Ana Markl e de Alexandra Saldanha, ilustradora e membro da banda Unsafe Space Garden e do projeto Santa Lúcida. A obra vai ser apresentada este sábado, às 21.30 horas, na Fábrica das Ideias, na Gafanha da Nazaré, Ílhavo, e nasceu no âmbito do projeto “Esta máquina cerca o ódio e força-o a render-se”, criado pela estrutura artística vimaranense ondamarela. O objetivo é claro: derrubar o ódio.
A própria Ana Markl e o filho são os protagonistas da história de “Para que serve esta mánica?”, um livro que, nas palavras da radialista, “acaba por ser uma parábola, para percebermos como é que nós olhamos para os outros”. “Sentir ódio é, muitas vezes, ter medo. E não ter medo é ser livre. Todas essas coisas estão muito ligadas, também, com estes 50 anos do 25 de Abril que estamos a celebrar e que precisamos de celebrar, cada vez com mais força”, sustenta a voz da Antena 3.
“A Ana tem uma frase muito linda no livro, aquando da chegada do alien ao planeta terra. A dado momento, ela escreve que ele tem medo do medo dos outros. Essa frase acaba por ser, depois, a base de tudo o resto”, desvenda Alexandra Saldanha.
Da liberdade ao amor via “Zoom”
Ana e Alexandra não se conheciam. Foram os membros da ondamarela que entenderam que as duas, juntas, podiam encontrar uma linguagem comum. “Convidaram-nos para encontrarmos métodos, dentro das nossas áreas de experiência e de não experiência, de cercar o ódio e forçá-lo a render-se. E também para percebermos o que é isso, no nosso contexto de pessoas humanas, a experienciar a vida na terra, e criarmos algo”, explica Alexandra Saldanha.
O “algo” a criar acabaria por ser decidido por ambas. Conheceram-se à distância, via Zoom, e falaram – falaram muito – sobre o que é a liberdade, o ódio e o amor, entre outros temas. Começaram à superfície e mergulharam no mais íntimo. “Acabámos por encontrar um patamar, que é o nosso fascínio pela infância. Quer seja através das nossas crianças interiores, quer através das crianças exteriores, que é também o meu filho”, diz Ana Markl. O “algo” só podia, por isso, ser um livro infantil. “Mas que fale também aos adultos. Que tenha essa linguagem das crianças, mas que seja emocionante para qualquer pessoa que leia. Como, aliás, qualquer bom livro infantil deve ser”, sublinha.
“Para que serve esta mánica?” é complementado com uma exposição, também inaugurada hoje, resultado da semana de residência artística que as duas autoras fizeram na Gafanha da Nazaré, ao longo da última semana, junto da comunidade.
Muito do trabalho a ser exposto parte, também, da observação dos ensaios de uma performance comunitária – desenvolvida pela onda amarela, com a participação de cidadãos locais – que sobe ao palco amanhã, às 17 horas, também na Fábrica das Ideias. Afinal, para cercar o ódio, as roldanas da “máquina” da ondamarela trabalharam em várias frentes, nos últimos dias: duas oficinas – uma para as escolas, outra para as famílias –, um espetáculo, um debate, um livro e uma exposição. Se o ódio não se render, mais condicionado fica, pelo menos.