Cantora brasileira estreia-se em novo formato, como MC e DJ, este sábado no Porto. Ao JN, fala de viver no “parapeito do agora” e da sua relação com Portugal.
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Viver no “parapeito do agora”. É assim que Bia Ferreira explica a atração pela experimentação, mesmo que a tire da sua zona de conforto. Depois de andar em tournée com violão, piano ou banda, a artista brasileira de 31 anos estreia o seu novo formato MC/DJ no Plano B, no Porto, às 22 horas deste sábado.
Cantora, compositora, ativista, voz firme na defesa de causas sociais e políticas, Bia volta à Invicta no meio da digressão mundial do seu disco “Faminta”. Em conversa com o JN, explica que a nova experiência vem do desejo de fazer mais e de chegar a novos públicos.
“‘Faminta’ é um disco muito de rap, e ainda não tinha testado esse formato. Quis experimentar, e fi-lo pela primeira vez em Lisboa, em abril. Porque venho dessa cultura, das rimas de rua, dos slams de poesia”, adianta.
Mas não só: “Também queria alcançar públicos diferentes. As pessoas que foram ao meu concerto de piano não sei se gostariam do espetáculo de rap; mas já consegui falar com elas, espero ter-lhes tocado no coração. Agora, quero tocar naquelas que curtem o rap. Até porque, géneros à parte, tudo é arte. Com roupa diferente, mas o mesmo intuito: tocar no coração”.
O violão é um escudo
Com esta retórica, pareceria fácil a mudança. Só que não é, admite a cantora, assumindo a “dependência” do seu violão. “Sinto-me desprotegida sem ele. É o meu escudo, a muleta. E aqui, experimento-me mais livre em palco, só eu, microfone e público. É um lugar vulnerável, mas gosto”, diz, citando a amiga e poeta Ryane Leão: “Ela disse-me que eu gosto de viver no ‘parapeito do agora’. E achei muito bonito. Estes concertos têm-me trazido essa adrenalina, o novo”.
No Porto, apoiada pelo DJ Mihai, Bia rodará então “Faminta”, álbum em duas partes, uma dedicada ao amor e outra às questões sociopolíticas.
Sobre a parte do amor, diz-se surpreendida. “Quase me assustei com a forma como as pessoas absorvem as canções de amor. Acho que o público que já conhecia esperava a análise política, mas gostou da outra. Tenho recebido retornos muito positivos de crianças, de professoras que usam o disco na escola”, revela.
Falar das soluções
“Este álbum trouxe-me muita alegria. Uma realização de alcançar espaços a que ainda não tinha chegado. E de conseguir falar sobre amor”, admite a artista. “Acho que falava muito sobre os problemas e esquecia-me das soluções. E a solução é o amor, a empatia com o outro”.
Não quer isto dizer que o ativismo, tão forte nos concertos, fique de parte; é intrínseco a Bia, que acredita no poder da música para abrir mentalidades. “Tenho recebido mensagens que me emocionam. Depoimentos sobre a transformação através da arte que proponho”, frisa.
“Tenho visto transformações reais e tenho-as vivido”. E dá um exemplo: “Tenho 31 anos e vivo da música desde os 16. E os meus pais foram ver-me cantar pela primeira vez há dois meses. Tê-los na plateia, a aplaudir o que faço, a entender a mensagem, foi tudo” diz. Vindos de passado mais religioso e conservador, “é um dos maiores milagres e transformações que a arte pôde trazer para mim”.
Uma troca, tal como a relação, já longa, com Portugal. “Sinto-me em casa, há muito afeto. Mas, mais do que entenderem-me, os portugueses estão disponíveis a abrir o debate. A minha narrativa também mudou a partir da troca que tenho com o público português. É uma troca”, conclui.