Um assalto milionário, preparado ao mais ínfimo pormenor, está na base de “Caleidoscópio”, série televisiva composta por nove episódios.
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Em tempos que hoje parecem muito distantes e até quase impossível terem existido, quando não estávamos em casa à hora certa para vermos determinado episódio de uma série, tínhamos de recorrer a amigos para não perder o fio à meada, pois eles não estavam disponíveis online nem os mortais comuns dispunham de meios de os gravar...
De certa forma, “Caleidoscópio”, uma criação de Eric Garcia, funciona como antítese do que acabei de evocar. Não porque se possa perder algum dos nove episódios desta série - são todos fundamentais - mas porque, com excepção do primeiro, que mais do que um episódio funciona como trailer da série, e do último, os outros podem ser vistos por qualquer ordem.
Na sua base, está uma das mais rentáveis e apreciadas ‘receitas’ dentro do género: um grande assalto, cuidadosamente planeado por um grupo heterogéneo, onde as atrações e os choques são inevitáveis e de que cada componente tem uma especialidade necessária ao bom sucesso da empreitada. A esta base, sempre sedutora, é acrescentada uma vingança, um pai que a vida de crime há muito separou da filha e algumas histórias paralelas que ajudam a compor o relato e criam motivos de interesse suplementares.
Mas, como já escrito atrás, cada episódio - identificados por cores, sendo “Negro” o tal intróito - pode ser visto sob qualquer sequência, embora seja aconselhável que o momento chave da série - o golpe, a que corresponde o episódio “Branco” - seja visto só no final, ou seja, já depois de sabermos o que aconteceu posteriormente, por razões que quem assistir à série compreenderá. Em termos de construção, com o golpe a corresponder ao ‘momento zero’ da série, cada episódio é definido em função de um determinado acontecimento cronológico, afastado horas, dias, meses ou anos, antes ou depois, daquele ponto fulcral.
Neles, acabaremos por saber o que opõe o cérebro do golpe (Giancarlo Esposito) ao seu alvo (Rufus Sewell), como aquele se afastou da filha (Tati Gabrielle), as relações que diversos componentes do bando cruzam, a preparação do assalto… e como este afinal decorreu.
Desta forma, se a história em si - o roubo de 7 milhões de dólares de um cofre supostamente inexpugnável - já é suficientemente desafiadora e cativante, todo o conceito narrativo que está por detrás de “Caleidoscópio” torna a sua visualização mais estimulante.
Caleidoscópio
Criação: Eric Garcia
Com Giancarlo Esposito, Rufus Sewell, Paz Vega e Tati Gabrielle
Netflix, 2022