“Paid in memories” álbum de Jessie Reyez , coleção de radiografias sentimentais
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“Não poderia ser eu, não poderia ser eu.” É assim que Jessie Reyez nos agarra pela garganta em “Cudn’t be me”, faixa-punhal de um álbum que não pede licença para existir – simplesmente sangra. “Paid in memories” não é um disco. É um espelho partido. E Reyez não se preocupa em colar os cacos: ela canta por entre os estilhaços.
Neste tema, a dor não se esconde atrás de produções luxuosas. O piano é quase ausente, um lamento tímido ao fundo, enquanto a voz – imperfeita, real, ferida – toma o centro como uma confissão feita às três da manhã, com as luzes apagadas. Reyez não canta para ser entendida: ela canta porque não há outra saída. É como se o universo lhe dissesse: Eu ouvi-te, mas não tenho saída.“Paid in memories” é inteiramente feito de instantes assim – pedaços que doem, mas que já não se pedem desculpa por doerem.
A abertura com “I never said I was sane” é um aviso em tom de desabafo: Jessie não está aqui para fazer sentido, está aqui para sentir. E nós, se estivermos dispostos, vamos com ela. A produção mistura experimentalismo e silêncios com a mesma coragem com que Jessie mistura vulnerabilidade com raiva. Em “Palo santo”, ela afunda. Em “Nights we’ll never have”, chora o que ficou por dizer. Em “Jeans”, dança, mas com os olhos vermelhos.
Neste álbum Jessie atreve-se em terrenos como Funk, afrobeats, R&B e com a sua voz rouca consegue embrulhar tudo com uma cativante destreza. Não há artifício: há pele e cicatriz. E fúria que ama. “Cudn’t be me” é o coração do disco – onde ela reconhece que perdeu versões de si mesma, e que talvez isso seja crescimento. Ou só dor. Ou os dois. Jessie Reyez não quer consolo: quer dizer a verdade. Mesmo que seja feia. Mesmo que seja só para ela. E isso – isso é o que a torna absolutamente impossível de ignorar. Não o são todas as cicatrizes?
“Paid in memories”
Jessie Reyez
2025