Evento marcante dos primeiros oito anos da Casa da Música, Clubbing teve edição especial e levou multidões a ver JP Simões, Conferência Inferno ou Puta da Silva.
Corpo do artigo
Música a irromper em todos os cantos e salas, gente a espalhar-se como água em todas as direções, algumas impedâncias junto a portas e escadas rolantes, um espírito geral de avidez – pelos concertos, pela exploração do poliedro. Foi assim o regresso do Clubbing, esta quarta-feira à noite, à Casa da Música, no Porto: uma enchente de entusiasmo.
Evento que marcou os primeiros oito anos do edifício desenhado pelo arquiteto neerlandês Rem Koolhaas e que se integrou, agora, no programa que assinala o 20.º aniversário da sua inauguração.
Foi criado como espécie de festival intensivo, realizado uma vez por mês, onde se mostravam manifestações recentes (e históricas) da música urbana, com variações entre o rock, a eletrónica e o experimentalismo. Acolheu números como Vampire Weekend, LSD Soundsystem, ESG, Pere Ubu ou Tuxedomoon.
A enquadrar os concertos, dispunham-se, em vários pontos do edifício, os melhores alquimistas da música de dança, culminando toda a festa no restaurante com vista sobre a cidade.
Um desejo para 2026
O Clubbing juntava melómanos de todas as idades, gente informada e atenta às vanguardas, gerando uma comunidade consistente que não falhava uma.
Era também uma alínea importante na carta de princípios da Casa da Música – a “casa de todas as músicas” sonhada por Pedro Burmester – com diversidade de propostas, diversidade de públicos. Há doze anos que desapareceu.
Este regresso, porém, não significa que o Clubbing tenha vindo para se implantar, pelo menos para já. Em entrevista recente ao JN, o novo diretor do equipamento, François Bou, que iniciou funções em janeiro e ainda não participou no desenho da programação de 2025, admite retomar o evento no futuro, mas reformulando o conceito, passando a apostar no cruzamento entre músicos convidados e os agrupamentos residentes da Casa, como a Orquestra Sinfónica do Porto ou o Remix Ensemble.
Se este desejo de regresso se concretizar, o Clubbing surgirá novamente em 2026.
No seu ressurgimento episódico na noite de quarta-feira, e em regime gratuito – o que criou algumas dificuldades na circulação e no acesso às salas, além de deixar à porta do edifício umas largas dezenas –, imperou a prata luso-brasileira.
O cartaz nem parecia o mais importante, cativava o emblema “Clubbing” e a recuperação daquela dinâmica de esmiuçar todos os recantos do edifício.
Houve concertos na Sala Suggia – uma revisão de carreira de JP Simões e o encontro de quatro craques do samba e do pagode, os Desengaiola. Atuações na Sala 2, espaço de acústica transcendente que ouviu o pós-punk dos portuenses Conferência Inferno (camadas de sintetizadores a lembrarem Human League, Visage ou Gary Numan, tudo muito bom, exceto aquela voz que parece sempre desalinhada e espúria) e o rock tropical, impuro, andrógino e visceral de Ákila – Puta da Silva, cantora e ativista transgénero goiana que se mudou para Lisboa.
Casa com vista
No Cibermúsica mergulhou-se na proposta de eletroacústica espacial e imersiva de Ece Canli, artista de origem turca radicada no Porto. E escutou-se os Solar Corona na sua versão Elektrishe Maschine – o que significa um psicadelismo de toada ambiental e propulsão sintética.
Nos bares espalhados pela Casa houve constante rotação de DJ e, como seria obrigatório num Clubbing, tudo desembocou, no fim de festa, às 4 da manhã, para o restaurante do último piso com vista sobre a cidade.vPrimeiro Clubbing em 12 anos deixou Casa da Música a abarrotar de entusiasmoPuta da Silva: rock tropical, impuro, visceral