
Escritor chileno Luis Sepúlveda
Em formato 100% online, edição deste ano do festival Correntes d'Escritas recorda o escritor chileno Luis Sepúlveda, falecido no ano passado.
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Há exatamente um ano, Luis Sepúlveda despedia-se dos muitos amigos que encontrou no festival literário "Correntes d'Escritas" com a promessa de regressar no ano seguinte, cumprindo um ritual iniciado mais de duas décadas antes. A inesperada (e muito sentida) morte do popular escritor chileno - ocorrida um mês e meio depois da sua passagem pela Póvoa de Varzim - tornou a promessa inconcretizável, mas a organização do evento fez questão de convocar a memória do autor de "Mundo do fim do Mundo", ao consagrar-lhe um conjunto de iniciativas que marcam a edição deste ano.
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"Quando me despedi dele no ano passado, com um forte abraço, convidei-o a regressar este ano. Estamos a cumprir a nossa parte", destaca Luís Diamantino, vice-presidente da Câmara da Póvoa de Varzim que se diz "eternamente grato a um amigo do festival e um dos responsáveis pelo seu crescimento ao longo dos anos".
A evocação far-se-á de múltiplas maneiras e passa por um número especial da revista "Corrente d'Escritas". Em mais de uma centena de páginas, perto de três dezenas de autores recordam o escritor desassombrado que foi, mas também o ativista, o defensor das liberdades, o ecologista e, antes de todos eles, o humanista.
Cúmplice de longa data, o fotógrafo argentino Daniel Mordzinski revela-nos "O mundo de Sepúlveda", um diário de imagens de uma amizade que passou por muitos projetos comuns através dos anos.
Tal como esta mostra fotográfica, todos os eventos que integram a 22.ª edição do festival literário poveiro - marcada para a próxima sexta-feira e sábado - são exclusivamente online. Uma solução que, embora não substitua a forte componente humana característica do festival, permite continuar a fazer chegar as palavras de alento dos escritores num momento de dificuldades gerais.
Otimista, Luís Diamantino vê no formato digital desta edição "uma oportunidade de chegarmos a mais pessoas", em especial junto da vasta diáspora local. "Suspender o evento nunca foi sequer hipótese, nem sequer mudar de data. As "Correntes" têm que ser em fevereiro, pois marcam o arranque do ano literário em Portugal. O que procurámos foi apenas fazer as devidas adaptações às atuais circunstâncias. Quem sabe se não vamos chegar a novos públicos que irão tornar-se no futuro espectadores assíduos?", interroga o autarca.
Apesar do formato digital - as sessões serão transmitidas na página web da Câmara da Póvoa, bem como no Facebook e YouTube -, tudo foi feito para manter a normalidade possível. Assim, não faltará uma cerimónia de abertura, composta por uma intervenção da ministra da Cultura e uma conferência a cargo do escritor e tradutor argentino Alberto Manguel, atualmente a residir em Portugal.
Um festival longe da vista mas perto dos ecrãs
Conversas
Mano a mano literário
Imagem de marca das "Correntes", as mesas-redondas transformam-se em conversas a dois por via digital, mas mantêm o figurino dos títulos improváveis. Afonso Cruz, Alberto Manguel, Lídia Jorge e Hélia Correia são os intervenientes em conversas que têm como mote "A poesia declara-se pouco rentável" ou "Os pobres perdoam tudo, menos o fracasso".
Residência literária
"Casa vazia"
A habitual residência literária decorre este ano em moldes muitos especiais, à semelhança dos contornos da própria edição. Em vez de escreverem uma narrativa na habitação em que se permanecem um dia, oito escritores (Afonso Reis Cabral, Bruno Vieira Amaral, Filipa Martins, Manuel Jorge Marmelo, Margarida Ferra, Maria Quintans, Ricardo Fonseca Mota e Teolinda Gersão) têm que ficcionar essa experiência, preenchendo de palavras a "Casa vazia".
Concurso literário
11 candidatos, 1 prémio
Logo no primeiro dia do evento, vai ser divulgado o vencedor do Prémio Literário Casino da Póvoa, que este ano irá consagrar uma obra de poesia. São 11 os livros candidatos a um prémio no valor de 20 mil euros: "A matéria escura e outros poemas", de Jorge de Sousa Braga; "Ágora", de Ana Luísa Amaral; "As catedrais nascem no mar", de Gilda Nunes Barata; "As Orelhas de Karenin", de Rita Taborda Duarte; "Estranhezas", de Maria Teresa Horta; "Fósforos e metal sobre imitação de ser humano", de Filipa Leal; "Frentes de Fogo", de M. Pires Cabra; "Junto à pedra", de Fernando Guimarães; "O coro da desordem", de Nuno Júdice; "Retratos com Erro", de Eucanaã Ferraz, "Sob a Forma do Silêncio", de Emanuel Madaleno.
Leituras
"Nas ruas da poesia"
Todos os anos, Rui Spranger, Renato Filipe Cardoso e João Rios encetam autênticas peregrinações literárias pela Póvoa, lendo poemas nos mercados ou nas praças. Este ano, confinamento "oblige", as sessões sofrem uma mudança, mas não terminam. O trio vai percorrer 12 locais emblemáticos do concelho, assegurando leituras que são registadas em vídeo e exibidas sexta e sábado.
Documentário
O olhar de João Cayatte
Em dois momentos específicos da história das "Correntes" - na 10.ª e na 20.ª edições -, João Cayatte registou em vídeo os encontros e as cumplicidades de que se tecem o festival. O resultado dessa incursão mais humana do que literária é um documentário que pode ser revisto online.
