Homenagem ao papel das mulheres, instalação artística "Penélopes" é um dos pontos altos da programação deste ano do festival poveiro Correntes d"Escritas.
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À primeira vista, parece um estendal como os outros, aparentemente frágil na sua estrutura, mas capaz, afinal, de enfrentar as intempéries mais severas. Um olhar mais cuidado revela-nos, todavia, em que consistem estas "Penélopes", nome de uma instalação artística que entrelaça o artesanato e a literatura.
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Na zona central do emblemático Diana Bar, o mesmo espaço que acolheu tertúlias de José Régio, Agustina Bessa-Luís ou Manoel de Oliveira, perfilam-se agora uma dúzia das típicas camisolas poveiras, debruadas com símbolos, palavras e analogias referentes a outras tantas narrativas escritas por autoras como Ana Luísa Amaral, Inês Cardoso, Patrícia Portela ou Rosa Alice Branco.
Nesta improvável aliança entre o artesanato e a literatura, é o papel da mulher que sobressai. Tal como a Penélope grega, também as mulheres dos pescadores poveiros sempre esperaram pacientemente pelo regresso dos seus companheiros, carpindo mágoas ao mesmo tempo que cuidavam dos filhos e do lar, com doses insuperáveis de entrega e estoicismo.
"Reparámos que todos os testemunhos sobre o tema sempre se centraram no ponto de vista masculino. Faltava a visão das mulheres, ainda mais relevante neste caso, porque a comunidade piscatória poveira sempre foi profundamente matriarcal", explica Minês Castanheira, da cooperativa Bairro dos Livros, autora do projeto que integra a programação da 22.ª edição das "Correntes d"Escritas".
Ao convite para que as escritoras criassem um texto original, seguiu-se a confeção das inconfundíveis camisolas poveiras, processo laborioso a cargo de uma dúzia de artesãs.
O entusiasmo foi o sentimento dominante ao longo do processo, gerando um conjunto de cumplicidades que esbateu até a distância física. As 24 "Penélopes" que deram forma e sentido ao projeto só por uma vez se encontraram, e por Zoom, mas ficou prometida, no período pós-confinamento, uma visita ao bar provisoriamente transformado em galeria de arte. "Houve um diálogo permanente entre todas as intervenientes que gerou uma ligação muito forte", sintetiza a responsável do Bairro dos Livros.
Para os demais interessados, embora a visita presencial da instalação seja, para já, impraticável, é possível acompanhar pela Internet o desenvolvimento do projeto desde a fase inicial.
Os textos e as imagens que integram o projeto estão também reunidos num livro homónimo, publicado pela Câmara da Póvoa.