António Reis faleceu esta terça-feira aos 77 anos, no Porto, vítima de doença prolongada. O legado continua.
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António Reis, um dos míticos atores do Porto, faleceu ontem aos 77 anos de idade, após doença prolongada. Dono de uma voz e de um sorriso inconfundíveis, e de uma paixão empedernida pelo Boavista Futebol Clube, nunca lhe faltaram histórias para contar.
Nascido a 20 de janeiro de 1945 na freguesia de Massarelos, António Manuel Lopes da Silva Reis passou dois terços da vida no palco, marcando indelevelmente a sua história, com "73 peças representadas - 47 das quais como ator principal -, assinadas por autores como Jorge de Sena, Camilo Castelo Branco, Santareno, Gil Vicente, Júlio Dinis, Almeida Garrett, Moliére, Beckett, Garcia Lorca, Mrozek, Brecht, Sófocles, Pirandello, Chico Buarque de Hollanda, Tolstoi, Shakespeare, Copi, Schaffer, Müller", como enunciou ao JN.
Em 1964 inicia a atividade no Grupo dos Modestos, em frente ao edifício do "Jornal de Notícias". Chegou a confessar que "ficávamos à espera que imprimissem o JN para ler a crítica".
Na ditadura, para se ter carteira profissional de ator, eram necessárias 500 representações - e ele conseguiu-as todas. Em 1970 ingressou no Teatro Experimental do Porto e, três anos mais tarde, tornou-se fundador e diretor da Seiva Trupe - Teatro Vivo, juntamente com Júlio Cardoso e Estrela Novais. "No mesmo dia em que assassinaram o Salvador Allende", contava.
Força e inspiração
Além do palco, António Reis marcou presença na televisão, em dezenas de séries, telenovelas e outros programas. Foi padre em "A viúva do enforcado", Barão de Forrester em "O vinho do Porto", advogado em "Os Andrades". A sétima arte também conta com o seu trabalho, nomeadamente em cinco filmes de Manoel de Oliveira: "Vale Abraão", "Inquietudes", "Palavra e utopia", "Quinto Império" e "Cristóvão Colombo - O enigma".
António Reis foi igualmente um dos fundadores do FITEI - Festival de Teatro de Expressão Ibérica. "Ele teve uma força de vontade enorme e inspiração para que o FITEI fosse relevante", disse o atual diretor artístico do certame, Gonçalo Amorim.
Ao longo da carreira, recebeu distinções como a Medalha de Mérito Cultural da Câmara Municipal do Porto (1988), a comenda da Ordem do Infante (1995) e o prémio Lorca, pela Universidade de Granada, em Espanha (1995). António Reis teve cinco filhas.
Vários quiseram homenagear o ator, afastado dos palcos desde 2017. A Seiva Trupe escreveu: "Foram dezenas os êxitos, quer no palco, quer como corresponsável da emblemática estrutura teatral do Porto, sendo difícil distinguir, pelas suas qualidades e personalidade inconfundíveis, a escolha entre o famoso "Um cálice de Porto" ou, antes, "Perdidos numa noite suja" de Plínio Marcos, ou, depois, em "Macbeth" de Shakespeare ou "Uma visita inoportuna" de Copi"". A atriz Rute Miranda, com quem partilhou produções da Seiva Trupe, agradeceu "as centenas e centenas de gargalhadas que demos juntos". Amigo de quase uma vida, o ator Óscar Branco reconhece que, "mesmo sendo uma notícia esperada, não deixa de doer". "Partiu uma das grandes referências do teatro no Porto. Ator, homem bom, e um dos fundadores do Seiva Trupe e do FITEI." O também humorista lamenta a partida de "uma das grandes referências do teatro no Porto" e promete continuar "a aplaudir e a recordar" a sua carreira.