Álbum “Vincent e Van Gogh”, de Gradimir Smudja, foi lançado em versão integral.
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E se afinal, as sublimes pinturas que desde sempre atribuímos ao génio de Van Gogh, afinal não tivessem sido pintadas por ele, mas pelo seu gato?! É esta a base de “Vincent e Van Gogh”, que a Arte de Autor acaba de editar em versão integral.
O autor é Gradimir Smudja, nascido na então Jugoslávia, em 1954, que desenvolve aquela tese, de forma bem-humorada e original, partindo do salvamento do felino pelo artista. Como recompensa, este último desata a pintar, ao mesmo tempo que entre os dois se desenvolve uma relação tóxica com Vincent (o gato) a ser dominante e tirano e a submeter e reduzir à sua pequenez aquele que conhecíamos como pintor.
Explorando factos históricos, a relação com outros artistas da época, as técnicas, cores e telas que (re)conhecemos como da autoria de Van Gogh e explicando até a famosa perda da orelha, Smudja acaba por nos levar por um passeio com tanto de histórico quanto de irreal numa época-chave da História da Pintura europeia, subvertendo e fantasiando enquanto faz a narração. Vivendo como um pobre diabo, Van Gogh só depois de morto, por mãos travessas, irá assinar as telas e ascender à fama que em vida não gozou, espelhando uma realidade comum a muitos outros criadores.
Se o relato inicial “Vincent e Van Gogh” tinha tido edição nacional há duas décadas, já “Três luas”, segundo relato deste sólido volume, era até agora inédito em português. Partindo da ressurreição do pintor, e do gato, quais zombies, fá-los embarcar numa viagem pelo tempo e pelas artes porque, para lá da pintura, desta vez também são evocados o cinema, a escultura, a poesia e a própria banda desenhada, numa corrida desenfreada em que tempo e espaço se confundem.
Vladimir Smudja, de quem a editora Arte de Autor já tinha proposto “Mausart” no ano transato, uma versão ficcionada das vidas de Salieri, Mozart e Stradivarius, com animais antropomorfizados, direcionada primeiramente para um público juvenil, neste díptico mais uma vez utiliza a técnica de pintura a pastel em que é mestre para desafiar leitores maduros a deixarem-se mergulhar nos meandros da criação, nas questões de autenticidade e propriedade intelectual e, de forma subjacente, nas próprias telas e noutras obras famosas e reconhecidas.