Este sábado celebra-se o Dia Mundial do Flamenco e a reboque da efeméride há vários espetáculos do género esta semana. Das várias propostas destaca-se "Sombra Efímera II" de Eduardo Guerrero trazido pelo Festival de Flamenco Lisboa/Porto, esta quinta-feira, na Casa da Música no Porto.
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Desde 16 de novembro de 2010 que o flamenco foi declarado Património Mundial da Humanidade, pela UNESCO. A distinção não vem de forma gratuita já que obriga a uma série de requisitos. Foram séculos de construção de uma interminável bagagem histórica, etnomusical e sócio-cultural para o reconhecimento, mas são também necessários vários requisitos para a sua manutenção. Um destes e talvez o mais visível para o grande público são os espetáculos.
Se o aflamencado sempre teve um grande acolhimento comercial em Portugal, muito a reboque das estrelas das décadas de ouro do cinema espanhol e com a explosão da música espanhola nos anos 90, o flamenco no seu estado "puro", sendo esta designação discutível, não obtém a mesma receção.
A não ser que seja inequivocamente excelente. Eduardo Guerrero faz parte deste lote, o bailaor de Cádiz nascido em 1983, prova que a geração de 1980 é agora a residente na cúpula flamenca. Mas no seu caso com linguagem decalcada do "Decalogo do baile flamenco masculino" de Vicente Escudero.
A verticalidade do seu baile, as linhas longas, técnica depurada e as voltas vertiginosas dão-lhe um magnetismo ímpar. Como se fosse atemporal e sem necessidade de refugiar-se em artifícios balofos ou palminhas fáceis. A fórmula resulta de horas de trabalho continuado durante anos e para quem gosta de dança não há melhor deleite do que este.
De luz e sombra
“Sombra Efímera II” do Eduardo Guerrero é uma viagem intensa pelo flamenco contemporâneo, mas com um toque surreal que só ele consegue dar. Guerrero, pega nos palos tradicionais e manda-os para uma dimensão completamente nova: martinete, seguiriya, e uma profunda soleá, transformado numa fusão inesperada de sombras e movimentos que parecem sair de outro mundo.
Dentro de uma estrutura de luz e sombra, uma espécie de jaula luminosa desenhada pelo Carlos Torrijos e Juanjo Llorente, parece respirar com ele. Cada passo é seguido por sombras que se multiplicam, se desdobram, como ecos das emoções que está a sentir. Ali, o flamenco vai além do que estamos habituados – não é só técnica, é uma expressão crua e brutal da alma.
Uma dimensão quase cinematográfica, onde o tradicional e o moderno coexistem em perfeita harmonia. O flamenco está vivo, em constante transformação. Um espetáculo para sair e pensar, na passagem do tempo, e na força das sombras – e como tudo, afinal, é tão efémero.
No dia 22 repete no Casino do Estoril.